SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO
Acórdão
FISCAL
Processo

0537/14

Data do documento

11 de março de 2015

Relator

Isabel Marques Da Silva


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RELEVÂNCIA


Descritores

Juros indemnizatórios
Erro nos pressupostos


Sumário

I - O direito a juros indemnizatórios previsto no n.º 1 do artigo 43.º da Lei Geral Tributária pressupõe que no processo se determine que na liquidação “houve erro imputável aos serviços”, entendido este como o “erro sobre os pressupostos de facto ou de direito imputável à Administração Fiscal”.
II - A anulação de um acto de liquidação com o fundamento de que a AT não demonstrou a verificação dos pressupostos para o recurso à tributação por métodos indirectos de que se socorreu (vício de violação de lei por erro nos pressupostos) é de considerar como erro imputável aos serviços, erro que, porque levou a uma ilegal definição da relação jurídica tributária do contribuinte e da qual terá resultado o pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido à luz das normas fiscais substantivas, justifica a condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios.

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

- Relatório -

1 – A Fazenda Pública recorre para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, de 30 de Dezembro de 2013, que julgou procedente as impugnações judiciais (apensadas) deduzidas por A………, Lda, contra liquidações adicionais de IRC relativas aos anos de 1994 e 1995 e juros compensatórios, restringindo a sua discordância com o decidido ao segmento da sentença que condenou a Administração Tributária ao pagamento de juros indemnizatórios à impugnante.
A recorrente termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
A) Vem o presente recurso da sentença que julgou procedente por provada a presente impugnação e, em consequência, anulou as liquidações de IRC de 1994 e 1995, no valor global de € 34.425,31 e condenou a FP ao pagamento de Juros Indemnizatórios;
B) Está patente na decisão que: «In casu a liquidação foi anulada devido a vício de lei por erro nos pressupostos no recurso a métodos indirectos e o direito a juros indemnizatórios previsto no n.º 1 do artigo 43.º da Lei Geral Tributária pressupõe que no processo se determine que na liquidação “houve erro imputável aos serviços”, entendido este como “erro sobre os pressupostos de facto ou de direito imputável à Administração Fiscal”, (Ac. STA de 24.02.2010, P. 022/10).
Logo, neste termos, a impugnante tem direito a juros indemnizatórios».

C) Contudo, a Fazenda Pública não pode conformar-se com tal decisão.

D) Resulta do Capítulo V - Fundamentação Fáctico-jurídica que: «Ora, a AT tinha que explicar as premissas que levaram a estas conclusões. A AT não explica porquê que concluiu daquela forma e não de outra. De facto, no Relatório não consta a fundamentação daquelas conclusões.» (...) «Nota-se assim, que o Relatório de Inspecção Tributária não se encontra devidamente fundamentado nem na fase da qualificação para aplicação dos métodos indirectos nem na fase da sua quantificação. A avaliação indirecta é a ultima ratio fisci e exige uma cuidada fundamentação quanto à opção pela sua utilização. Nota-se que o destinatário do acto não consegue entender as razões e o percurso lógico seguido pela entidade decisora, não podendo escrutinar o mesmo»;

E) In fine, a Mma Juiz conclui que a AT não logrou demonstrar os pressupostos do recurso à tributação indiciária, todavia, o citado capítulo apenas se debruça sobre o vício da falta de fundamentação dita substancial;

F) Sendo pertinente lançar mão do Acórdão do TCA Sul de 11-06-2013, processo 06739/13 que aborda a dicotomia de fundamentação formal versus substancial referindo que: «uma coisa é saber se a Administração deu a conhecer os motivos que a determinaram a actuar como actuou, as razões em que fundou a sua actuação, questão que se situa no âmbito da validade formal do acto; outra, bem diversa e situada já no âmbito da validade substancial do acto, é saber se esses motivos correspondem à realidade e se, correspondendo, são suficientes para legitimar a concreta actuação administrativa»;

G) Na situação decidenda, é claro que o vício que resulta verificado na sentença é tão só a falta de fundamentação formal pois constata-se que a AT não explicou porque concluiu de determinada forma, não se debruçando a sentença sobre a realidade dos factos e a sua adequação aos motivos encontrados para a aplicação dos métodos indirectos;

H) Estabelece o art. 43.º, n.º 1 da LGT que são devidos Juros Indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido;

I) São Doutrina (nomeadamente a posição de Jorge Lopes de Sousa in Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, 6 edição, Volume I – págs. 531 e 532) e Jurisprudência (vide Acórdãos do STA de 04-11-2009, processo n.º 0665/09 e de 10-04-2013, processo n.º 01215/12) assentes que não se subsumem na expressão erro imputável aos serviços os vícios de forma e a incompetência pelo que a anulação de um acto de liquidação com base apenas em vício de forma por falta de fundamentação não implica a existência de qualquer erro sobre os pressupostos de facto ou de direito do acto tributário, logo não existe o direito a juros indemnizatórios a favor do contribuinte, previsto no n.º 1 do art. 43.º da LGT;

J) Assim, embora a pretensão do contribuinte mereça provimento no que toca ao imposto, não se verifica o direito a juros indemnizatórios, padecendo, assim, a sentença recorrida de erro de julgamento.

Termos em que, deve ser dado provimento ao presente recurso, ordenando-se em consequência, a substituição da douta sentença recorrida, por outra em que, após a análise do seu mérito, não se condene a FP a Juros Indemnizatórios, com as legais consequências.
2 – Não foram apresentadas contra-alegações.
3 - O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Supremo Tribunal emitiu o parecer de fls. 170/171 dos autos, concluindo que parece que o recurso é de proceder, sendo de anular o decidido quanto a serem devidos juros indemnizatórios, sem prejuízo de noutra sede, nomeadamente, da aplicação do previsto no art. 100.º da LGT se poder entender serem os mesmos devidos.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

- Fundamentação -

4 – Questão a decidir
É a de saber se, como alegado, a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao julgar serem devidos juros indemnizatórios.
5 – Na sentença objecto de recurso foram fixados os seguintes factos:
1 - A Impugnante exerce a atividade de instalação de canalização e climatização. (doc. de fls. 77 e sgs., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, o mesmo se dizendo para todos os que infra se descrevem.)
2 - Em cumprimento da Ordem de Serviço n.º 19870 de 08.09.1997, os Serviços de Inspeção Tributária da Direcção Distrital de Finanças de Viseu, procederam a uma ação de inspeção à Impugnante, relativa aos exercícios dos anos de 1994 e 1995. (doc. de fls. 77 e sgs.)
3 - Da acção de inspecção referida em 2. resultou o Relatório de Exame à Escrita, do qual consta com interesse para a decisão, o seguinte: “(...)

13 – CARACTERIZAÇÃO DA EMPRESA E SEU HISTÓRICO

13.1 – DESCRIÇÃO DA ACTIVIDADE

A empresa ora objecto de análise, substituiu a A’………., empresa esta que envolvia a mesma actividade e ocupava as mesmas instalações.

A A’………., objecto de exame já concluído em 30/09/97, com base na falta de apresentação das declarações mod. 22 dos exercícios de 1993 a 1994, faltas estas supridas após o terminus do exame efectuado, contava como sócios: B……..e C………. A firma A………., além destes possui ainda os filhos do casal D……… e E……….

A actividade desenvolvida é de “instalação de canalização e Climatização”.

A actividade que vinha desenvolvendo é de “Instalação de canalizações e sistemas de climatização”, tanto de energias renováveis, caldeiras a lenha, como gás ou fuel.
A sede da empresa era na Rua …….. – …………- Viseu.

14 – ELEMENTOS DA ESCRITA

14.1 – Tem Contabilidade organizada nos termos da lei comercial e fiscal? SIM X NÃO
14.2 Registos contabilísticos estão em dia? SIM X NÃO Até que data? 31/08/97

Observações:
A actividade exercida possui duas componentes; o material aplicado e a respectiva mão-de-obra.
Nos exercícios de 1992; 93 e 94, os registos Contabilísticos, da firma por esta substituída permitiam através do lançamento das guias de remessa dos materiais para as diversas obras, uma análise quer individualizada quer global das margens brutas dos serviços prestados com aplicação do material.

Na nova empresa, não existem elementos que nos permitam a análise destes indicadores.

Os orçamentos exibidos, não descriminam o material a aplicar e as guias de remessa também não permitem.

Face ao citado e à presente actividade ser no todo, igual à exercida pela A’………, quer em termos de pessoal, instalações e gerentes sugerem-se os indicadores por esta apresentados e aceites, abaixo discriminados.

(…)

III. ANÁLISE CONTABILÍSTICO-FISCAL

(…)
2.2 SERVIÇOS PRESTADOS COM APLICAÇÃO MATERIAL

A contabilidade da A………. não permite discriminar as aplicações de material nas diversas obras. A contabilização e feita integralmente na conta “venda de mercadorias”.
Nos exercícios de 1992/93/94, os elementos e informações disponibilizadas pela A’……….., permitiam, através do lançamento das guias de transporte dos materiais para as obras, uma imputação global dos mesmos, na rubrica “serviços prestados com aplicação de materiais”. Nesta empresa foi criada a conta reflectida 93219, com base nas referidas guias de transporte para as obras, possibilitando a analise do C.E.V.C. dos consumos “ANEXO 1”.

Assim, procedemos a uma análise comparativa dos valores relativos à firma A’…….., LDA e A……….., LDA. Os valores indicados para aquela serão os que foram considerados na determinação do respectivo resultado fiscal, dado não ter precedido à entrega dos competentes Doc. Mod 22.

A’………. A………. EXERCÍCIO 1992 1993 1994 1994 1995 S. Prestados14.252.853$24.945.523$6.264.475$27.737.586$34.073.341$ CEVCS Prestados8.001.891$15.767.208$3.508.553$ 0 0 CEVE Global21.132.874$25.439.537$ LUCRO BRUTO6.250 962$9.178.315$2.755.922$6.604.712$8.633.804$ MLB 78% 58% 78% 31% 33%
2.3 ANÁLISE DO C.E.V.C./VENDAS PRESTADAS

Com a finalidade de testarmos os consumos efectivos, com o valor dos S. Prestados Declarados, vamos de seguida determinar o CEVC global da actividade:

A’……….. A……… 1993 1994 19941995 1 E. INICIAL4.382.034$2.701.580$ 0 5.317.411$ 2 COMPRAS22.187.451$1.728.520$27.737.586$25.104.410$ 3 SUB-TOTAL26.569.485$3.930.100$27.737.586$30.421.821$ 4 E. FINAIS2.701.580$ 0 5.317.411$4.982.284$ 5 C.E.V.C.23.867.905$4.430.100$21.132.874$25.439.537$ 6 C.E.V.C.S.Prest.15.767.208$3.508.553$ ? ? 7 C.E.V.C. Vendas943.057$1.169.600$ ? ? 8 SOMA16.710.265$4.678.153$ ? ? 9 Mercad. OMITIDA
S.P. Custo+ 7.157.640$- 248.053$ ? ?
Conforme se constata, na A’……… LDA, foram determinadas omissões em vendas e serviços prestados, para o ano de 1993, em montante igual ao CEVC de respectivamente de 7 157 640$ acrescido das respectivas margens dos sectores onde foram praticadas 78% para prestação de serviços e de 25% para Vendas.

3. CORRECÇÕES PROPOSTAS PARA O CONTRIBUINTE “A……….. Lda.

Tendo presente os valores corrigidos na A’…….. Lda. e os declarados pela A………Lda., constata-se uma divergência significativa nas MLC, apuradas assim:

A’………. A……… 1993 1994 1994 1995 1 E. INICIAL 4.382.034$2.701.580$ 0 5.317.411$ 2 COMPRAS 22.187.451$1.728.520$27.737.586$25.104.410$ 3 SUB TOTAL 26.569.485$3.930.100$27.737.586$30.421.821$ 4 E. FINAIS 2.701.580$ 0 5.317.411$4.982.284$ 5 C.E.V.C. 23.867.905$4.430.100$21.132.874$25.439.537$ 6 V. NEGÓCIOS 38.694.232$ 7.726.475$27.737.586$34.073.341$ 7 M.L.BRUTA 62% 74% 31% 33%
3.1 - CÁLCULO DO VOLUME DE NEGÓCIOS DA A…………, LDA 1994/95

Face à impossibilidade de testar as Margens efectivamente obtidas, dada a inexistência de elementos com a imputação dos materiais aplicados às obras, somos de propor para os anos de 1992/93/94, na A’…….. Lda. Assim:

3.2 - VOLUME DE NEGÓCIOS PARA 1994

C.E.V.C. – 21.132.874$ * 1,62 = 34.235.256$

3.3 – VOLUME DE NEGÓCIOS PARA 1995

C.E.V.C. – 25.439.537$ * 1,62 = 41.211.682$

3.4 – CUSTOS 1994/95

Foi efectuado controle dos documentos existentes, não se detectando erros ou omissões formais, susceptíveis de correcções.

Todavia para manter uma rentabilidade fiscal aproximada nos dois exercícios em análise (+ - 18%), estimamos para 1994, custos de 1.505.569$.

4. – I.V.A.

4.1.1 - IVA NÃO LIQUIDADO NÃO ENTREGUE

O I.V.A. resultante da diferença entre as Vendas e S/Prestados, facturados, vai calcular-se, considerando as Omissões praticadas passíveis de I.V.A. à TAXA NORMAL, face à análise e conferência de caldeiras a lenha não revelar anomalias PONTO 3.6 Existências, não revelar OMISSÕES, nas caldeiras ou recuperados a Lenha.

1994 1995 V.NEGÓCIOS CORRIGIDOS 34.235.256$ 41.211.682$ V.NEGÓCIOS DECLARADOS 27.737.586$ 34.073.341$ DIFERENÇA 6.497.670$ 7.138.341$
4.1.2 – CÁLCULO DO IMPOSTO

1994 – Volume de negócios omitidos 6.497.670$ * 16% = 1.039.627$
1995 - Volume de negócios omitidos 7.138.341$ * 17% = 1.213.580$

4.1.3 – DISTRIBUIÇÃO TRIMESTRAL

Imposto não terá sido liquidado nem entregue regularmente ao longo do ano pelo que iremos distribui-lo uniformemente pelos respectivos trimestres.

1994 1995 1.º TRIMESTRE …… 259.906$ 1.º TRIMESTRE………… 303.395$ 2.º TRIMESTRE…… 259.907$ 2.º TRIMESTRE ……… 303.395$ 3.º TRIMESTRE…… 259.906$ 3.º TRIMESTRE………… 303.395$ 4.º TRIMESTRE…… 259.908$ 4.º TRIMESTRE ……… 303.395$ TOTAL ………… 1.039.627$ TOTAL……………… 1.213.580$
(…)

VI - CONCLUSÕES

Face ao exposto, conclui-se que os registos contabilísticos e a DM. 22 não traduzem os resultados efectivamente obtidos, nomeadamente porque:

a) A contabilidade não especifica claramente as operações efectuadas.

b) Os resultados fiscais declarados, são diminutos e não compatíveis com o volume e características da actividade exercida;

c) Os testes e cálculos efectuados, conduzem à determinação de valores significativamente superiores aos declarados.

VII – PROPOSTAS

Face ao exposto e às inexactidões encontradas, verifica-se que os elementos de escrita não traduzem a verdadeira situação patrimonial do contribuinte nem os resultados efectivamente obtidos, pelo que, dada a impossibilidade de se proceder ao seu apuramento de uma forma clara inequívoca, propõe-se que o mesmo se faça com recurso a métodos indiciários, conforme preceitua o disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 51.º do CIRC, sendo o resultado fiscal, apurado nos termos da alínea a) do art. 52.º do mesmo Código. Assim, serão efectuadas as seguintes correcções aos exercícios de 1994/ 95.

(…)»

(Doc. de fls. 77 e sgs).

4. A Impugnante apresentou pedido de revisão da matéria tributável, tendo decorrido a reunião da Comissão de Revisão no dia 20.05.1998, constituída pelo vogal da AT, pelo vogal da Impugnante e pelo perito, para cuja ata n.º 55 se remete por uma questão de brevidade. (Doc. de fls. 44 e sgs.)

5. No âmbito do pedido de revisão da matéria tributável foi proferida no dia 20.05.1998, decisão pelo Presidente da Comissão, para a qual se remete por uma questão de brevidade. (Doc. de fls. 43)

6. A presente Impugnação foi apresentada no Serviço de Finanças de Viseu - 2 no dia 11.01.1999 (Doc. de fls. 2 e sgs). 6 – Apreciando.
6.1 Dos juros indemnizatórios
A sentença recorrida, a fls. 110 a 133 dos autos, julgou procedente a impugnação deduzida pela ora recorrida contra liquidações de IRC de 1994 e 1995, anulando-as e condenando a Administração tributária ao pagamento dos peticionados juros indemnizatórios, no entendimento de que a liquidação foi anulada devido a vício de lei por erro nos pressupostos no recurso aos métodos indirectos e o direito a juros indemnizatórios previsto no n.º 1 do artigo 43.º da Lei Geral Tributária pressupõe que no processo se determine que na liquidação “houve erro imputável aos serviços”, entendido este como o “erro sobre os pressupostos de facto ou de direito imputável à Administração Fiscal”, (Ac. do STA de 24.02.2010, P. 022/10) – cfr. sentença recorrida, a fls. 132 dos autos.
Discorda do decidido quanto à condenação no pagamento de juros indemnizatórios a recorrente, alegando, em síntese, que as liquidações foram anuladas por vício formal de falta de fundamentação, razão pela qual entende - com a jurisprudência e doutrina que cita -, não serem devidos juros indemnizatórios em face do n.º 1 do artigo 43.º da LGT.
Vejamos.
Questão paralela à que é objecto dos presentes autos foi recentemente decidida por este STA por Acórdão do passado dia 17 de Dezembro, rec. 0841/14, estando aí em causa o IVA relativamente ao mesmo período de tempo, liquidado com base no mesmo relatório de inspecção e sendo idêntico o probatório fixado, a decisão recorrida e as conclusões das alegações da recorrente (salvo no que respeita ao imposto em causa e respectivo montante).
Não é controvertida nos autos, e corresponde a jurisprudência consolidada deste STA (devidamente citada naquele Acórdão de 17 de Dezembro último), a interpretação segundo a qual o direito a juros indemnizatórios previsto no n.º 1 do artigo 43.º da Lei Geral Tributária pressupõe que no processo se determine que na liquidação “houve erro imputável aos serviços”, entendido este como o “erro sobre os pressupostos de facto ou de direito imputável à Administração Fiscal”, que não se tem como verificado se a anulação foi determinada por vício formal (falta de fundamentação formal, incompetência, preterição do direito de audiência prévia ou outros vícios formais equiparáveis).
A controvérsia nos autos reside, apenas, na interpretação da própria sentença, que a recorrente considera ter anulado as liquidações por vício formal de falta de fundamentação e não por vício substancial, razão pela qual entende não serem devidos juros indemnizatórios.
Mas não lhe assiste razão.
O Tribunal “a quo” condenou a Administração tributária ao pagamento de juros indemnizatórios com o fundamento de que “a liquidação foi anulada devido a vício de lei por erro nos pressupostos no recurso aos métodos indirectos” (cfr. sentença recorrida, a fls. 132 dos autos), porquanto considerou que “a AT não logrou demonstrar os pressupostos do recurso à tributação indiciária ou por presunções (cfr. sentença recorrida, a fls. 131 dos autos), conclusão a que chegou no tratamento da questão decidenda que enunciou como “ERRO NOS PRESSUPOSTOS PARA A APLICAÇÃO DOS MÉTODOS INDIRECTOS//ERRO NA QUANTIFICAÇÃO/FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO (substancial) – cfr. sentença recorrida, a fls. 121 dos autos.
A propósito desta questão - a que deu conhecimento prioritário em cumprimento do disposto no artigo 124.º do CPPT (cfr. sentença recorrida, a fls. 113 dos autos), deixando para o final a questão da preterição de formalidades legais, que acabou por não conhecer porquanto ficou prejudicada pela procedência de fundamentos prioritariamente conhecidos – a sentença recorrida teceu considerações várias a propósito da excepcionalidade da tributação por métodos indirectos e do ónus da prova quanto à demonstração dos respectivos pressupostos legais vinculativos pertinentes, considerando a final, para aferir se a AT cumpriu os ónus acima indicados, que a AT misturou a qualificação, ou seja, a aferição da existência ou não dos pressupostos do recurso à tributação por métodos indirectos, com a quantificação, ou seja, a aplicação dos critérios para apurar o lucro tributável (cfr. sentença recorrida, a fls 129 dos autos), concluindo que a AT não logrou demonstrar os pressupostos do recurso à tributação indiciária ou por presunções (cfr. sentença recorrida, a fls. 131 dos autos).
Resulta, pois, da sentença recorrida que a razão determinante da anulação das liquidações foi o julgamento – não sindicado nos presentes autos – de que não estavam verificados os pressupostos para o recurso à tributação por métodos indirectos, o que significa que a decisão foi proferida com fundamento no vício de violação de lei por erro sobre os pressupostos de direito (por errada interpretação e aplicação das normas que legitimam a tributação por métodos indirectos), como se decidiu no Acórdão deste STA de 17 de Dezembro último (rec. n.º 841/14).
É certo que, como também se observou no citado Acórdão, a sentença também discorreu profusamente sobre a fundamentação dos actos tributários em geral e da decisão de recurso aos métodos indirectos em particular (fls. 123 a 128 dos autos), mas é seguro que não foi com fundamento na verificação de vício de forma por falta de fundamentação que julgou ilegais os actos impugnados, antes em razão da verificação do vício de violação de lei por erro nos pressupostos de direito do recurso a tais métodos.
E assim sendo, como nos parece inequivocamente que é, nenhuma censura merece a condenação da Fazenda Pública ao pagamento de juros indemnizatórios, ex vi do disposto no n.º 1 do artigo 43.º da Lei Geral Tributária, por verificar-se erro imputável aos serviços de que resultou pagamento indevido de imposto.
Pelo exposto se conclui estar o recurso votado ao insucesso.

- Decisão -

7 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.

Sem custas, por a recorrente delas estar isenta à data em que foi deduzida a impugnação.
Lisboa, 11 de Março de 2015. - Isabel Marques da Silva (relatora) - Francisco Rothes - Fonseca Carvalho.



Fonte: http://www.dgsi.pt