Recurso excepcional de revista (e dupla conforme) - Tópicos de reflexão
Enquadramento – o recurso de revista
A revista é o recurso ordinário que tem por objecto um acórdão de um tribunal da Relação e é dirigido ao Supremo Tribunal de Justiça.
Opera de acordo com as regras gerais de admissibilidade, sobretudo as do valor da causa e da sucumbência; e através delas o Supremo Tribunal é chamado a avaliar a correcção de alguma ou várias questões sentenciadas no acórdão da 2.ª instância.
Esse acórdão recorrido, por regra, deve ter-se pronunciado sobre uma decisão do tribunal de 1.ª instância que conheceu do mérito da causa ou que, sem o conhecer, pôs todavia fim ao processo (no sentido de ter absolvido o réu ou algum dos réus quanto a pedido ou reconvenção deduzidos).
Nesse particular, desencadeado o recurso de revista, o Supremo solucionará a questão aplicando definitivamente o regime jurídico que julgue adequado aos factos materiais fixados pelo tribunal da Relação sem os poder alterar, o que só muito excepcionalmente pode acontecer, ou então, se a matéria de facto não for suficientemente consistente para o permitir, dirá (apenas) qual é aquele regime jurídico adequado e ordena que a Relação, ajustando o vício de que padece a factualidade, julgue a seguir aplicando esse quadro normativo indicado; caso em que desta segunda decisão da Relação já não caberá revista (o Supremo cumpriu já o seu papel de dizer o direito).
Se o acórdão recorrido for nulo, o regime de substituição, que é pleno no recurso de apelação (artigo 665º), é mitigado; nuns casos o Supremo suprirá e julgará, noutros mandará baixar para suprir e julgar (artigo 684º).
Seja como for, está aberto o caminho à revista da decisão sucessiva das instâncias.
Desenvolvimento – a dupla conforme
1. Nos termos do artigo 671º, nº 3, do CPC, “sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância, salvo nos casos previstos no artigo seguinte”.
É esta norma que reflecte a designada de dupla conforme, como situação processual impeditiva do direito potestativo ao recurso para o Supremo Tribunal de Justiça; portanto, do acesso ao recurso de revista.
Foi com a reforma do direito dos recursos cíveis, em 2007, que se introduziu no Código de Processo Civil esta regra, através da qual se pretendeu racionalizar o acesso ao Supremo, dando resposta à sentida tendência de crescimento dos recursos cíveis, e criar as condições para um melhor exercício da sua função de orientação e uniformização da jurisprudência.[1]
A dupla conforme foi assim eleita como instrumento de filtragem do recurso de revista, fundado na verificação empírica de que se duas instâncias e quatro juízes decidiram em conformidade, então, por critérios de razoabilidade ocorre um bom julgamento.
Por outro lado, se o acórdão da Relação nessas condições torna inadmissível o recurso de revista – evidenciando uma função negativa – também a dupla conforme constitui uma plataforma (uma condição) para viabilizar a reapreciação do caso pelo Supremo, na medida em que este tribunal assim o aceite, no quadro que estabelece o artigo 672º do Código de Processo Civil – evi-denciando aqui uma função positiva –.
Mas que é, afinal, a dupla conforme?
2. A lei não o esclarece com a devida nitidez e, com esse vazio, potencia dificuldades e equívocos que vêm induzindo entropias ao funcionamento do sistema, porventura a aconselhar uma intervenção legislativa clarificadora.
Um acórdão da Relação que coincida exactamente, e em tudo, com a sentença da 1.ª instância será isento de dúvida. Mas coincidência ou sobreposição total das decisões não é a situação corrente; as mais das vezes ocorrem derivações, em alguns casos mais sensíveis, em outros nem tanto.
E considerar que qualquer mutação ou ténue aditamento ao teor decisório da sentença, em comparação com a decisão contida no acórdão, põe em causa a conformidade, como instrumento de filtragem, poderá parecer algo excessivo.
Na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça [2] tem-se ponderado a questão de saber, por exemplo, se constitui dupla conforme o caso em que a parte obtém na Relação uma decisão de conteúdo mais favorável do que o alcançado na sentença apelada – se sobe na vida para usar uma expressão que já ouvi – embora continuando a decair ou sucumbir parcialmente – porventura nu-ma dimensão acentuada – relativamente à pretensão que inicialmente formulou.
Em caso de divergência quantitativa entre as decisões das instâncias verificar-se-á dupla conforme e, por consequência, inibição de interpor revista se a parte obtém no acórdão da Relação uma reformatio in melius relativamente aos montantes arbitrados?
E verifica-se dupla conforme na situação em que ocorra no acórdão da Relação uma alteração qualitativa ou de natureza relativamente ao decidido na sentença apelada, desde que mais favorável à parte – por exemplo, convolando-se uma interdição para uma inabilitação ou uma absolvição total do pedido ou da instância para uma condenação parcial do réu?
Neste segundo caso afigura-se, no mínimo, discutível a existência do requisito estruturante da confirmação da decisão apelada pela Relação. De todo o modo, ao menos no essencial das situações, a questão estará resolvida pela redacção actual do artigo 671º, nº 3, quando hoje exige, ao contrário do pretérito, a fundamentação essencialmente diferente para sustentar a exclusão da dupla conformidade, fundamentação que por regra estará presente como alicerce para uma decisão de natureza qualitativamente diferente, se bem que mais favorável.
Quanto ao primeiro caso, de divergência quantitativa para melhor, a jurisprudência maioritária no Supremo é a de que há dupla conforme na situação em que a parte, peticionando mil na petição, obtém dez na sentença e vê a sua situação melhorada na 2.ª instância que lhe concede cem – apesar de ser um valor ainda muito longe dos mil inicialmente pedidos. Ao lesado que obteve melhoria (ainda que ténue em função do que pretendia) está excluído o acesso ao Supremo.
Mas já o réu, na mesma causa, que queria ser totalmente absolvido e condenado primeiro em dez e depois em cem, porque vê a sua posição agravada, não estará constrangido pela dupla conforme e poderá recorrer de revista… – o que é passível de criar alguma estranheza.
Por um lado, porque então a dupla conforme está isenta de natureza objectiva e constitui, ao invés, uma espécie de situação subjectiva que inibe a revista apenas para uma das partes, apesar de ambas terem ficado parcialmente vencidas – e de forma relevante e intensa as duas – perante a decisão da Relação.
Por outro, porque desta forma e com tais características o critério distintivo da dupla conforme não será já o da coincidência decisória, mas o de uma especial regra de sucumbência, a acrescer àquela que a norma geral do artigo 629º, nº 1, contém e consistente na alternativa melhoria ou agravamento de posição no confronto das duas decisões.
Acresce que a tese que vence actualmente no Supremo origina fundadas dúvidas em matéria de admissibilidade da interposição de recurso subordinado pela parte que vê melhorada em 2.ª instância a sua situação – isto é, quid júris no seguinte caso: irrecorrível para a parte a título principal o acórdão da Relação que lhe trouxe mais vantagens do que a sentença, mas ainda assim com um decaimento acentuado em face do pedido que inicialmente formulou, está-lhe aberto recorrer a título subordinado na hipótese de a contraparte (que viu na mesma medida a sua posição agravada) recorrer a título principal?
É um tema que vem sendo objecto de decisões contraditórias nas secções cíveis do Supremo Tribunal de Justiça; entendendo uns que o recurso subordinado, no quadro do artigo 633º, se supera outros obstáculos à recorribilidade, também não pode deixar de superar este outro, da dupla conformidade; e entendendo outros que, à luz da letra do nº 5 do mesmo artigo 633º, a dupla conforme mantém o seu carisma impeditivo da revista, mesmo subordinada.
Outra questão que tem sido objecto de análise no Supremo é a do confronto dupla conforme com unidade e incindibilidade do objecto processual, por um lado, ou com autonomia e cindibilidade de objectos processuais, por outro; entendendo-se que a conformidade ou desconformidade opera separadamente apenas para cada objecto processual autónomo que as instâncias decidiram, por consequência unicamente relativamente a cada uma das pretensões autónomas formuladas na causa – pensando-se aqui, por exemplo, na cumulação de pedidos ou na reconvenção –.
Não há, a respeito de um único objecto do processo (de uma única pretensão formulada), possibilidade de fatiar assuntos – questões, argumentos ou razões – sobre as quais as duas instâncias se hajam pronunciado para dizer que em algumas há concordância – e por conseguinte dupla conforme – e noutras o não há – por os dois pontos de vista divergirem –.[3]
Assim, num pedido indemnizatório por responsabilidade civil extracontratual, em que as pretensões são fatiadas em parcelas de danos não patrimoniais, perdas de ganho, dano biológico ou despesas realizadas em consequência do facto lesivo, não é sobre cada uma destas – meramente instrumentais do pedido global formulado – que o juízo de conformidade deve ser feito, mas outrossim sobre a pretensão global da parte; não se podendo dizer que há dupla conforme a respeito de danos morais, que as instâncias fixaram pelo mesmo valor, mas desconformidade a respeito das perdas materiais, que foram avaliadas diferentemente.[4]
Mas já será diferente se a um pedido de condenação na restituição de capital mutuado acrescer o pedido acessório – autónomo e cindível – de juros respectivos; neste caso, a coincidência em matéria de pedido principal e a divergência apenas quanto à taxa de juro aplicável ao caso, permitem reconhecer a dupla conforme quanto ao primeiro, vedando a respeito deste o recurso de revista, separando-o da segunda pretensão, quanto à qual o recurso para o Supremo fica em aberto.
E quid juris quando, sendo inequívoca uma dupla conforme, visa a parte suscitar vícios ou irregularidades do próprio acórdão da Relação – por exemplo, pretende arguir junto do Supremo um não adequado exercício pelo tribunal da Relação dos seus poderes em sede de impugnação da matéria de facto ou, doutra sorte, quer invocar nulidades que inquinem o mesmo acórdão?
Aqui se tratam, evidentemente, de questões novas, apenas reveladas no âmbito do julgamento e da intervenção do tribunal de recurso em 2.ª instância e perfeitamente alheias ao tribunal da sentença – quanto a elas não faz sentido pensar em conformidade ou desconformidade decisórias…
E exactamente a sua arguição é instrumental e visa destruir a dupla conforme que, via de regra, se assume existir.
Enquanto objecto de recurso para o Supremo estão, portanto, à margem da revista excepcional; e não podem deixar de ser objecto de recurso de revista normal.[5]
Numa hipótese destas, pedindo o interessado a revista excepcional,[6] o Supremo vem decidindo com alguma estabilidade que a formação remete o recurso ao relator – semelhantemente ao artigo 672º, nº 5 – para julgamento do objecto da revista (exactamente os vícios novos); sendo o recurso procedente cumprirá suprir a falha, para o que o processo desce à Relação; sendo improcedente, e assumida a conformidade da decisão de mérito, competirá à formação, a quem o processo volta, dar a sequência processual que for devida.
Por fim, que significa a essencialidade de fundamentação diferente que o artigo 671º, nº 3, do CPC hoje [7] exige para excluir a conformidade das decisões das instâncias?
A primeira nota é a de que não basta uma sustentação diversa nas decisões; discrepâncias argumentativas traduzidas, por exemplo, num reforço de razões ou numa inovação acessória destinada a acentuar a bondade do decidido em 1.ª instância, não têm suficiente densidade para poder fazer superar a irrecorribilidade de revista que subjaz à identidade decisória.
Torna-se assim necessário que a solução conforme assente num modo radical e profundamente inovatório, traduzindo esta ideia a necessidade de uma mutação interpretativa essencial ou de uma transposição decisiva para um quadro normativo perfeitamente diverso e autónomo em uma e outra das decisões, ou ainda uma deslocação para um instituto jurídico perfeitamente distinto que sustenta a decisão recorrida, em moldes desconhecidos da sentença da 1.ª instância.
É o que acontece, por exemplo, se a 1.ª instância condena com base no instituto do enriquecimento sem causa e a Relação o faz a título de responsabilidade extracontratual.
E quid juris quando a Relação, no uso dos seus poderes de modificação da decisão de facto, decide alterar a realidade fáctica provada, dando factos da sentença por não provados ou ainda aditando-lhe outros – ou muito outros – que considera, agora inovatoriamente, revelados pelos meios de prova reapreciados em 2.ª instância?
Pese a transformação operada na factualidade jurídica e uma reconvertida ordenação da matéria que densifica as normas jurídicas de direito material, é indiferente para a verificação da dupla conforme essa distinta funda-mentação de facto.
Desde que a transformação da matéria de facto não tenha repercussão na solução jurídica encontrada para o litígio ou, pelo menos, não implique um descolamento decisivo na fundamentação de direito, não é essa transformação fáctica susceptível de abrir o caminho ao recurso de revista – se com aquela mesma sustentação jurídica do acórdão da Relação o recurso não era admissível, não é por ter havido alteração do alinhamento factual, sem repercussão essencial no enquadramento de direito, que o recurso passa a ser admissível; mesmo com a mutação factual continua, nesse caso, a haver dupla conforme.
O Supremo Tribunal de Justiça só conhece matéria de direito.
Essencial é o segmento decisório e a sustentação jurídica – a conformidade ou desconformidade tem sempre de reportar-se a matérias passíveis de serem conhecidas pelo Supremo Tribunal de Justiça.
Todas as demais lhe são inócuas.
3. Para terminar uma questão essencial de competência – a quem incumbe avaliar a existência de uma dupla conforme? Ao relator e à conferência? Ou à formação constituída nos termos do artigo 672º, nº 3, do CPC?
O problema tem de ser colocado e clarificada a resposta a dar.
Situações como aquela que foi subjacente à prolação do acórdão do Tribunal Constitucional nº 151/2015, de 4 de Março, através da qual a parte viu impedido o seu recurso pela formação, que entendeu inexistir dupla conforme, e o viu impedido pela conferência, que entendeu existir dupla conforme, não abonam a um funcionamento são do sistema.
Vejamos.
A dupla conforme exclui a possibilidade de revista (artigo 671º, nº 3).
Ao mesmo tempo, cria a plataforma necessária para o funcionamento do mecanismo designado por revista excepcional (artigo 672º). Aqui, uma formação de três juízes conselheiros anualmente escolhidos pelo presidente do Supremo exerce uma competência sustentada em juízos de discricionariedade com o objectivo de verificar, de entre os casos de inadmissibilidade de revista, aqueles que o Supremo aceita julgar e aos quais abre, por razões exclusivas de interesse público [8], a porta da revista (nº 3).
Esta decisão é definitiva e insusceptível de qualquer impugnação (nº 4).
Estabelece o artigo 672º, nº 5, que “Se entender que, apesar de não se verificarem os pressupostos da revista excepcional, nada obsta à admissibilidade da revista nos termos gerais, a formação prevista no nº 3 determina que esta seja apresentada ao relator, para que proceda ao respectivo exame preliminar”.
Com esta redacção, a lei parece supor que o pedido de revista excepcional encerra em si, ao menos em forma tácita, o pedido de interposição do comum recurso de revista. Constituindo ambos a manifestação de vontade para o acesso à revista, a relação é de inclusão.
A pretensão de um interessado que quer ver o seu caso julgado no Supremo e formula o seu pedido, no confronto entre a revista normal e a revista excepcional, em termos cumulativos, alternativos ou subsidiários, é inidónea e logicamente contraditória.
É uma situação potenciadora de perturbações e de entropias ao funcionamento do sistema – e que são, aliás, reais no quotidiano do STJ.
Todos nós somos muito adeptos, em abstracto, da consagração genérica de procedimentos de gestão processual e de uma adaptação casuística de comportamentos processuais às necessidades de caso concreto. Mas a verdade é que depois, na prática concreta, quando falta a normazinha clara…
Por isso – mas não só – a lei está, nesta matéria, carente de um aperfeiçoamento e de uma clarificação urgentes.
Não é aceitável a ocorrência de casos como aquele a que o Tribunal Constitucional tranquilamente deu guarida. Como não é aceitável a multiplicação, dentro do Supremo, da circulação de processos, durante largos períodos de tempo (intoleráveis), entre a formação e o relator – quando o que o sistema quer é um mecanismo célere de rejeição ou aceitação da revista excepcional, com uma decisão sumária e insusceptível de impugnação (artigo 672º, nº 4).
À parte é que compete, como ónus seu, escolher o meio pelo qual quer aceder ao STJ; ónus que é puro e simples, e não condicional ou condicionado. Se entende que tem direito ao recurso, por não haver dupla conformidade, é esse direito que deve exercer, interpondo a revista. Se entende que a dupla conformidade se verifica, e que não tem o direito de recorrer, o que deve é invocar a faculdade de pedir a reapreciação no quadro da designada revista excepcional.
Na dúvida, deve optar – apenas – pela revista excepcional, por ser o mecanismo mais abrangente na garantia de acesso ao Supremo.
Quid juris quando os mecanismos são desencadeados a título cumu-lativo, alternativo ou subsidiário?
Quero crer que, tudo visto e ponderada a formulação do nº 5 do artigo 672º, sempre que o interessado assim proceda, a sequência a seguir deva ser, ao menos no primeiro momento, o estabelecido para a revista excepcional.
Desde que o interessado vislumbre por possível a verificação de uma dupla conforme, automaticamente desencadeia o exercício de poderes pela formação dos três juízes; que, ou decide que ela existe, e então prossegue a sequência própria da revista excepcional, ou decide que não existe, e então remete o processo ao relator, nos termos do artigo 672º, nº 5.
E ponto final.
Esta decisão da formação vincula, como não pode deixar de ser, o relator e a conferência; não sendo concebível que dentro do próprio Supremo Tribunal de Justiça duas formações de juízes conselheiros se digladiem à volta de uma questão já intraprocessualmente decidida da conformidade ou não conformidade.
Nesta óptica, a que de início chamei a sua função positiva, compete à formação dos três juízes a competência exclusiva e definitiva para avaliar a existência da dupla conforme – plataforma e condição essencial para viabilizar a chamada revista excepcional.
Ao relator e à conferência ficará reservada a mesma avaliação, mas agora na óptica da função negativa. Desde que o recorrente apenas invoque o seu direito ao recurso para o Supremo, sem nunca equacionar uma eventual conformidade na decisão das instâncias, será ao relator – e à conferência – que caberá verificar uma dupla conforme inibidora do direito ao recurso, nos termos do artigo 671º, nº 3, do Código de Processo Civil.
4. Mesmo para finalizar, com a consciência de que estas breves notas evidenciam a insuficiência da regulamentação do mecanismo da revista excepcional, que a dupla conforme sustenta, deixo o meu apelo a uma urgente intervenção legislativa que permita aperfeiçoar e clarificar todo o modelo.
Pelo menos, assim se obviará a que o tribunal superior do país e os seus juízes continuem a enfrentar inúteis e consideráveis dificuldades, que quoti-dianamente vão tentando superar, embora de um modo que apenas consegue ser fragmentário.
[1] Já com a revisão de 1996 (Decreto-Lei nº 180/96, de 25 de Setembro) houvera sido ensaiado o mecanis-mo da dupla conforme aplicável ao agravo em 2.ª instância, embora rapidamente afastado (Decreto-Lei nº 375-A/99, de 20 de Setembro) perante as controvérsias então desencadeadas.
[2] Influenciada pela doutrina de Miguel Teixeira de Sousa.
[3] Numa perspectiva completamente diferente da propugnada, reportando-se a uma “filtragem temática operada pela Formação”, veja-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de Junho de 2018 (proc.º nº 152/13.0TCFUN.L1.S2).
[4] O AUJ nº 13/96, de 15 de Outubro (DR I-A de 26 de Novembro de 1996), faz pressentir este entendimento: « O tribunal não pode, nos termos do artigo 661.º , n.º 1, do Código de Processo Civil, quando condenar em dívida de valor, proceder oficiosamente à sua actualização em montante superior ao valor do pedido do autor. »
Apenas quando ocorre pluralidade de objectos materialmente autónomos é que a dupla conforme deve ser apreciada separadamente em relação a cada um desses objectos. Não é o que acontece quando há apenas um pedido de indemnização pelos danos sofridos, embora decomposto por parcelas em função da sua diferente natureza.
Apenas quando ocorre pluralidade de objectos materialmente autónomos é que a dupla conforme deve ser apreciada separadamente em relação a cada um desses objectos. Não é o que acontece quando há apenas um pedido de indemnização pelos danos sofridos, embora decomposto por parcelas em função da sua diferente natureza.
[5] Deixo aqui nota de que, do meu ponto de vista, esta terminologia (revista excepcional e revista normal), embora operativa como método de trabalho, não é rigorosa e é equívoca, posto que a revista é apenas uma, não há duas (excepcional e normal). O que há são duas realidades distintas: o recurso de revista, por um lado, e, por outro, um mecanismo específico de acesso ao STJ, pensado para certos casos de irrecorribilidade, que permite que excepcionalmente se possa aceder ao recurso de revista.
[6] Diferente é se o interessado, como deve ser, pedir revista normal; nessa hipótese, a sequência a seguir é a exactamente a da normal revista pela razão evidente de que, então, o objecto do recurso é exactamente ou a nulidade arguida ou a questão suscitada do errado uso dos poderes de reapreciação da matéria de facto em 2.ª instância.
[7] Não na versão pretérita em que a fundamentação era absolutamente irrelevante (artigo 721º, nº 3, na anterior versão do CPC).
[8] E não já por um direito potestativo da parte ao recurso.
Luís Filipe Brites Lameiras [*] [**]
[*] Juiz Desembargador do Tribunal da Relação de Lisboa. Foi docente do Centro de Estudos Judiciários na área cível, comercial e de processo civil (2003 - 2010). Entre 2013 e 2018 exerceu as funções de Chefe do Gabinete do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça. É actualmente Inspector Judicial do Conselho Superior da Magistratura.
[**] Texto que serviu de base à intervenção tida lugar no dia 14 Mar/ 2019 na sede do Conselho Regional da Madeira da Ordem dos Advogados.