Marco Carvalho Gonçalves

Publicado: 26 de julho de 2020

CÍVEL


Atos Processuais e Prazos no Âmbito da Pandemia da Doença COVID-19


 
  1. Introdução[1]
 
Como é consabido, no dia 30 de janeiro de 2020, a Organização Mundial de Saúde declarou a situação de Emergência de Saúde Pública de Âmbito Internacional da COVID-19, sendo que, mais tarde, em 11 de março de 2020, considerou a COVID‑19 como uma pandemia[2].  Tal situação pandémica conduziu à paralisação generalizada da vida económica e social, bem como da atividade da administração e dos tribunais, pelo que se tornou necessário regular quer a prática de atos processuais, quer as repercussões do tempo no âmbito das relações jurídicas de natureza substantiva e processual.
 Neste contexto, procurando dar resposta a essa necessidade, o legislador viria a publicar múltiplos diplomas nas mais diversas áreas[3], sendo certo que, em matéria de atos processuais e de prazos substantivos e processuais, há a salientar a publicação dos seguintes diplomas legislativos:
o Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, que veio estabelecer medidas excecionais e temporárias relativas à situação epidemiológica do novo Coronavírus - COVID 19;
        1. a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, que veio prescrever um novo conjunto de “Medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19”[4];
        2. a Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril, a qual procedeu “à primeira alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, que aprova medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, e à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, que estabelece medidas excecionais e temporárias relativas à situação epidemiológica do novo Coronavírus - COVID 19”;
        3. a Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, a qual adotou um “Regime excecional de flexibilização da execução das penas e das medidas de graça, no âmbito da pandemia da doença COVID-19”;
        4.  a Lei n.º 10/2020, de 18 de abril, a qual veio fixar um “Regime excecional e temporário quanto às formalidades da citação e da notificação postal, no âmbito da pandemia da doença COVID-19”;
        5.  o Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de maio, o qual veio alterar “as medidas excecionais e temporárias relativas à pandemia da doença COVID-19”;
        6. a Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, a qual modificou “as medidas excecionais e temporárias de resposta à pandemia da doença COVID-19, procedendo à quarta alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, à primeira alteração à Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, e à décima segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março”; e
        7.  o Decreto-Lei n.º 24-A/2020, de 29 de maio, que procedeu à alteração das “medidas excecionais e temporárias relativas à pandemia da doença COVID-19”.
 
Vejamos, de seguida, por referência ao tema do presente texto, o âmbito e o alcance de cada um dos citados diplomas legais.
 

 
  1. Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março
 
2.1. Âmbito
 
 Conforme resulta do respetivo preâmbulo, o Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março – o qual entrou em vigor no dia 14 de março de 2020[5] –, visou, nomeadamente, “aprovar um conjunto de medidas, atentos os constrangimentos causados no desenvolvimento da atividade judicial e administrativa”, mediante o “estabelecimento de um regime específico de justo impedimento e de suspensão de prazos processuais e procedimentais sempre que o impedimento ou o encerramento de instalações seja determinado por decisão de autoridade de saúde ou de outra autoridade pública”.
 No prosseguimento desse desiderato, o capítulo VI desse diploma legal, intitulado de “Atos e diligências processuais e procedimentais”, instituiu, por um lado, um regime excecional de justo impedimento, justificação de faltas e adiamento de diligências processuais e procedimentais (art. 14.º) e, por outro lado, um regime especial de suspensão dos prazos para a prática de atos processuais ou procedimentais (art. 15.º).
 
 
2.2. Justo impedimento, justificação de faltas e adiamento de diligências processuais e procedimentais
 
No que concerne ao justo impedimento, bem como à justificação de faltas e ao adiamento de diligências processuais e procedimentais, o art. 14.º, n.º 1, veio estabelecer, para efeito de verificação de um justo impedimento, que “a declaração emitida por uma autoridade de saúde a favor de sujeito processual, parte, seus representantes ou mandatários, que ateste a necessidade de um período de isolamento destes por eventual risco de contágio do COVID-19 considera-se, para todos os efeitos, fundamento para a alegação do justo impedimento à prática de atos processuais e procedimentais que devam ser praticados presencialmente no âmbito de processos, procedimentos, atos e diligências que corram os seus termos nos tribunais judiciais, tribunais administrativos e fiscais, tribunais arbitrais, Ministério Público, julgados de paz, entidades de resolução alternativa de litígios, cartórios notariais, conservatórias, serviços e entidades administrativas, no âmbito de procedimentos contraordenacionais, respetivos atos e diligências e no âmbito de procedimentos, atos e diligências regulados pelo Código do Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro, e demais legislação administrativa”.
A este respeito, importa salientar que a consagração desse regime especial de justo impedimento não deixou de ser redundante.
Com efeito, estabelecendo o art. 140.º, n.º 3, do Código de Processo Civil[6] a regra segundo a qual “É do conhecimento oficioso a verificação do impedimento quando o evento a que se refere o n.º 1 constitua facto notório, nos termos do n.º 1 do artigo 412.º, e seja previsível a impossibilidade da prática do ato dentro do prazo”, e sendo um facto notório a situação pandémica do COVID-19, o legislador acabou por impor um ónus desnecessário aos sujeitos ou intervenientes processuais que pretendessem invocar um justo impedimento, pois que obrigava-os a requerer, junto de uma autoridade pública de saúde, a emissão de uma declaração que atestasse a obrigação de permanência em isolamento, a fim de se prevenir o risco de contágio do COVID-19, quando é certo que as autoridades públicas de saúde recomendavam, precisamente, esse dever geral de isolamento.
Paralelamente, importa salientar que o art. 14.º, n.º 2, veio estabelecer que essa declaração “constitui, igualmente, fundamento de justificação de não comparecimento em qualquer diligência processual ou procedimental, bem como do seu adiamento”, no âmbito dos processos e procedimentos elencados no n.º 1 desse preceito legal.
Ademais, o art. 14.º, n.º 3, estendeu, com as devidas adaptações, a aplicação deste regime excecional do justo impedimento, de justificação de faltas e de adiamento de diligências processuais e procedimentais aos “demais intervenientes processuais ou procedimentais, ainda que meramente acidentais”.
 
 
2.3. Suspensão do prazo para a prática de atos processuais ou procedimentais
 
No que diz respeito à suspensão do prazo para a prática de atos processuais ou procedimentais, o art. 15.º do diploma legal em referência veio estabelecer um regime excecional, segundo o qual, na eventualidade de se verificar o encerramento de instalações onde tivessem de ser praticados atos processuais ou procedimentais no âmbito de processos e procedimentos referidos no art. 14.º, n.º 1, ou de suspensão de atendimento presencial nessas instalações, por decisão de autoridade pública, com fundamento no risco de contágio do COVID-19, consideravase suspenso o prazo para a prática do ato processual ou procedimental em causa, a partir do dia do encerramento ou da suspensão do atendimento[7].
 Por conseguinte, a suspensão do prazo para a prática de um determinado ato processual ou procedimental só se verificava na eventualidade de encerramento das instalações do tribunal ou do organismo onde o ato devia ser praticado, solução essa que encontrava fundamento em relação aos atos que devessem ser praticados presencialmente, mas já não no tocante àqueles que pudessem ser praticados através de transmissão eletrónica de dados[8]. Com efeito, dado que o processo judicial é tramitado eletronicamente (art. 132.º do CPC) e sendo obrigatória a prática de atos processuais, através de transmissão eletrónica de dados, nos casos em que as partes se encontrem patrocinadas por mandatário judicial (art. 144.º, n.º 1, do CPC), a circunstância de o tribunal se encontrar fisicamente encerrado não impedia, mesmo assim, a prática do ato através de transmissão eletrónica de dados.
Já o art. 15.º, n.º 3, do diploma legal em referência veio esclarecer que o regime excecional de justo impedimento, justificação de faltas e adiamento de diligências processuais e procedimentais, previsto no art. 14.º do mesmo diploma, era aplicável aos cidadãos, sujeitos processuais, partes, seus representantes ou mandatários que residissem ou trabalhassem nos municípios em que se verificasse o encerramento de instalações ou a suspensão do atendimento presencial, ainda que os atos e diligências processuais ou procedimentais devessem ser praticados em município diverso. Por conseguinte, se, por exemplo, um mandatário tivesse domicílio profissional num determinado município onde ocorresse o encerramento de um juízo (local ou central) cível, mas carecesse de comparecer numa audiência final a ser realizada num juízo cível de um outro município, este podia justificar a falta de comparência a essa diligência ou mesmo requerer o seu adiamento.
 
 
  1. Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março
 
​​​​​​​3.1. Âmbito
 
Apenas seis dias volvidos, a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março[9], procedeu à ratificação dos efeitos do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, bem como à aprovação de novas “medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2, agente causador da doença COVID-19”[10].
Vejamos, de seguida, quais foram essas medidas.
 

 
​​​​​​​3.2. Regime especial em matéria de prazos e de diligências
 
​​​​​​3.2.1. Aplicação do regime das férias judiciais
 
O art. 7.º, n.º 1, estabeleceu a regra geral, segundo a qual “aos atos processuais e procedimentais que devam ser praticados no âmbito dos processos e procedimentos, que corram termos nos tribunais judiciais, tribunais administrativos e fiscais, Tribunal Constitucional, Tribunal de Contas e demais órgãos jurisdicionais, tribunais arbitrais, Ministério Público, julgados de paz, entidades de resolução alternativa de litígios e órgãos de execução fiscal, aplica-se o regime das férias judiciais até à cessação da situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, conforme determinada pela autoridade nacional de saúde pública”, sendo que, por força do n.º 2 do mesmo preceito legal, esse regime vigoraria até ao termo da situação excecional, cessando, por conseguinte, em data a definir por decreto-lei.
Deste modo, a aplicação do regime das férias judiciais à prática de atos processuais veio implicar que, à luz do art. 137.º do CPC, não se praticavam, em regra, atos processuais.
Contudo, esse regime excecional não obstava à realização de citações, notificações, registos de penhora e atos que se destinassem a evitar um dano irreparável (art. 137.º, n.º 2, do CPC), nem à prática de atos processuais através de transmissão eletrónica de dados ou por telecópia (art. 137.º, n.º 4, do CPC).
Paralelamente, ainda que a lei não fosse muito clara, a verdade é que, sempre que a prática de um ato dependesse da contagem de um prazo – tal como sucedia, por exemplo, com a apresentação da contestação ou com a interposição de um recurso –, a aplicação a esse ato do regime das férias judiciais implicava que a contagem do prazo ficasse, necessariamente, suspensa, nos termos do art. 138.º, n.º 1, do CPC, salvo se estivesse em causa um prazo igual ou superior a seis meses[11]. Nessa exata medida, a aplicação deste regime não acarretava, por exemplo, a suspensão do prazo de deserção da instância, previsto no art. 281.º, n.º 1, do CPC, já que se tratava de um prazo com uma duração igual a seis meses.
 
 
​​​​​​​3.2.2. Suspensão dos prazos nos processos urgentes
 
No que em particular se refere aos processos urgentes, o art. 7.º, n.º 5, veio, de forma expressa, determinar que os prazos, em regra, ficavam suspensos, salvo nas circunstâncias previstas nos n.ºs 8 e 9 desse preceito legal.
A este respeito, importa tecer duas considerações.
Desde logo, é curioso observar que, em termos de técnica legislativa, o legislador enveredou pela aplicação de dois regimes distintos, com repercussões práticas igualmente diferentes. Com efeito, enquanto, em relação aos processos em geral, o legislador estabeleceu a regra segundo a qual os atos processuais a ser praticados nesses processos ficavam sujeitos ao regime de férias judiciais, sem fazer qualquer referência expressa à suspensão da contagem dos prazos – o que, como vimos supra, redundou na continuação da contagem dos prazos processuais cuja duração fosse igual ou superior a seis meses –, já no que diz respeito aos procedimentos cautelares, o legislador veio referir expressamente que, em regra, os prazos ficavam suspensos. Deste modo, por via da consagração deste regime, o legislador afastou a aplicação do disposto no art. 138.º, n.º 1, do CPC, segundo o qual a contagem dos prazos ficaria suspensa durante o período de férias judiciais, exceto quanto estivessem em causa processos urgentes.
Por outro lado, a suspensão dos prazos nos procedimentos cautelares não atendia à circunstância de estes procedimentos visarem, precisamente, evitar a produção de danos graves e irreparáveis ou de difícil reparação (art. 362.º, n.º 1, do CPC), deixando, por isso, desprotegido o requerente da tutela cautelar, com a agravante de o legislador desconsiderar a possibilidade de os atos processuais serem praticados através de transmissão eletrónica de dados. Por conseguinte, ressalvando a hipótese de invocação de justo impedimento, não se percebe por que razão o legislador acabaria por impor, por exemplo, a suspensão do prazo para o oferecimento da oposição ou para a interposição de recurso em sede cautelar, atenta a necessidade de se obviar à produção de um dano grave e irreparável ou de difícil reparação. 
 

3.2.3. Prática excecional de atos processuais
 
Apesar de o art. 7.º, n.º 1, ter estabelecido a regra geral, segundo a qual a prática dos atos processuais ficava sujeita ao regime das férias judiciais, e de o art. 7.º, n.º 5, ter imposto a suspensão dos prazos nos procedimentos cautelares, a verdade é que os n.ºs 8 e 9 do mesmo preceito legal vieram estabelecer dois regimes excecionais.
Por um lado, nos termos do art. 7.º, n.º 8, sempre que fosse tecnicamente viável, era admitida a prática de quaisquer atos processuais e procedimentais através de meios de comunicação à distância adequados, designadamente por teleconferência ou videochamada. Significa isto que, apesar de, em regra, ter ficado suspensa, por exemplo, a realização de audiências finais, o certo é que as mesmas poderiam ter lugar, desde que fosse viável o emprego de meios de comunicação à distância.
De todo o modo, esta solução não deixava de conduzir a resultados contraditórios. Basta pensar, por exemplo, que, no âmbito de um procedimento cautelar, a lei permitia, a título excecional, a realização de uma audiência de julgamento, mas determinava a suspensão dos prazos, razão pela qual, se essa audiência estivesse dependente do exercício do contraditório do requerido, a mesma ficava inviabilizada.
Por outro lado, à luz do art. 7.º, n.º 9, só podiam realizar-se presencialmente os atos processuais e as diligências urgentes em que estivessem em causa direitos fundamentais, nomeadamente diligências processuais relativas a menores em risco ou a processos tutelares educativos de natureza urgente, diligências e julgamentos de arguidos presos, desde que a sua realização não implicasse a presença de um número de pessoas superior ao previsto pelas recomendações das autoridades de saúde e de acordo com as orientações fixadas pelos conselhos superiores competentes.
 

3.2.4. Aplicação subsidiária
 
Atento o disposto nos n.ºs 6 e 7 do art. 7.º, o regime excecional previsto neste preceito legal aplicava-se, com as devidas adaptações:
  1. aos procedimentos que corressem termos em cartórios notariais e em conservatórias,
tal como sucedia, por exemplo, com os processos de inventário;
  1. aos procedimentos contraordenacionais, sancionatórios e disciplinares, e respetivos atos e diligências que corressem termos em serviços da administração direta, indireta, regional e autárquica, e demais entidades administrativas, designadamente entidades administrativas independentes, incluindo o Banco de Portugal e a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários; e
  2. aos prazos administrativos e tributários que corressem a favor de particulares, com a ressalva de que, no que concerne aos prazos tributários, os mesmos compreendiam apenas aqueles que dissessem respeito aos atos de interposição de impugnação judicial, reclamação graciosa, recurso hierárquico, ou outros procedimentos de idêntica natureza, bem como aos prazos para a prática de atos no âmbito dos mesmos procedimentos tributários.
 
 
3.2.5. Suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade
 
Nos termos do art. 7.º, n.ºs 3 e 4, a situação excecional constituía igualmente causa de suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade que fossem relativos a todos os tipos de processos e procedimentos, isto é, aos prazos de prescrição e de caducidade que dissessem respeito ao exercício de direitos em juízo. É o que sucedia, por exemplo, com o prazo de caducidade de 30 dias para a dedução de embargos de terceiro (arts. 344.º, n.º 2, e 138.º, n.º 4, do CPC), com o prazo de prescrição de três anos, no âmbito da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos (art. 498.º do Código Civil[12]), ou com o prazo de um ano para o exercício dos direitos de eliminação dos defeitos, redução do preço, resolução do contrato ou indemnização no âmbito da empreitada (art. 1224.º, n.º 1, do CC).
 Acresce que este regime especial prevalecia sobre quaisquer outros que estabelecessem prazos máximos imperativos de prescrição ou caducidade, sendo os mesmos alargados pelo período de tempo em que vigorasse a situação excecional[13].
Neste particular, importa salientar que, no que concerne aos prazos de caducidade, esta solução legal encontrava justificação no disposto no art. 328.º do CC, que estabelece a regra segundo a qual “O prazo de caducidade não se suspende nem se interrompe senão nos casos em que a lei o determine”. Deste modo, a suspensão do prazo de caducidade passava a encontrar amparo numa lei que, de forma expressa, determinava essa suspensão, por força de circunstâncias excecionais e transitórias.
Diferentemente, no que diz respeito ao prazo de prescrição, temos dúvidas de que houvesse necessidade de se dispor expressamente quanto à sua suspensão, já que, por força do regime vigente no art. 321.º, n.º 1, do CC,  a prescrição “suspende-se durante o tempo em que o titular estiver impedido de fazer valer o seu direito, por motivo de força maior, no decurso dos últimos três meses do prazo”[14]. O mesmo é dizer que, se, à data da entrada em vigor desse diploma legal, o prazo de prescrição se encontrasse nos últimos três meses, a contagem do prazo suspender-se-ia automaticamente, por força da lei.
Em todo o caso, o certo é que, por força da adoção daquele regime excecional, a contagem dos prazos de prescrição e de caducidade não só ficou suspensa a partir do dia 9 de março de 2020, como também a duração máxima desses prazos foi prolongada pelo período de tempo em que vigorasse a situação excecional[15].
 

3.2.6. Suspensão de processos e procedimentos
 
Nos termos do art. 7.º, n.º 10, ficaram suspensas as ações de despejo, os procedimentos especiais de despejo e os processos para entrega de coisa imóvel arrendada, quando o arrendatário, por força da decisão judicial final a proferir, pudesse ser colocado em situação de fragilidade, por falta de habitação própria.
Com efeito, atenta a situação pandémica e as recomendações das autoridades de saúde, no sentido de a população permanecer, sempre que possível, em confinamento nas suas habitações, esta solução legal visava dar acolhimento a essa orientação, protegendo, dessa forma, quer o arrendatário, quer o seu agregado familiar.
Já no que diz respeito à entrega, em sede de ação executiva para pagamento de quantia certa ou para entrega de coisa certa, de bem imóvel que constituísse a casa de habitação efetiva do executado, tal diligência encontrava-se suspensa por força da aplicação do regime previsto no n.º 1 do art. 7.º, que, como vimos, determinava a sujeição dos atos processuais ao regime das férias judiciais, com a consequente aplicação subsidiária do disposto no art. 137.º do CPC.
 

3.2.7. Adaptação do período de férias judiciais
 
Importa igualmente salientar que, a fim de se compensar a paralisação da atividade dos tribunais e de se acautelar o direito constitucional de acesso ao Direito e aos Tribunais, o n.º 11 do art. 7.º estatuía que, após a data da cessação da situação excecional referida no n.º 1 desse preceito legal, a Assembleia da República devia proceder à adaptação, através de diploma próprio, dos períodos de férias judiciais a vigorar em 2020[16].
 

3.3. Proteção da casa de morada de família
 
Paralelamente à medida constante do n.º 10 do art. 7.º, de suspensão das ações de despejo, dos procedimentos especiais de despejo e dos processos para entrega de coisa imóvel arrendada, o art. 8.º do diploma legal em anotação, visando a proteção dos arrendatários, introduziu dois regimes de natureza extraordinária e transitória até que se verificasse a “cessação das medidas de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, conforme determinada pela autoridade nacional de saúde pública”. Em concreto, o legislador determinou, por um lado, a suspensão da produção de efeitos das denúncias de contratos de arrendamento habitacional e não habitacional efetuadas pelo senhorio, e, por outro, a suspensão da execução de hipoteca sobre imóvel que constituísse habitação própria e permanente do executado.
 Observe-se que, no que em particular se refere à medida legislativa consistente na suspensão da execução de hipoteca sobre imóvel que constituísse habitação própria e permanente do executado, a mesma acabava por encontrar justificação na insuficiência da medida constante do n.º 1 do art. 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, consistente na aplicação do regime das férias judiciais à prática de atos processuais. É que tal não obstava à propositura da ação executiva para pagamento de quantia certa, através de transmissão eletrónica de dados (art. 137.º, n.ºs 1  e 4, do CPC), à realização de citações e de notificações, maxime entre o agente de execução, o exequente, o executado e os credores (art. 137.º, n.º 2, do CPC), nem à realização do registo de penhora sobre o bem imóvel onerado com a hipoteca (art. 137.º, n.º 2, do CPC), tanto mais que, por regra, a ação executiva para pagamento de quantia certa, fundada em título extrajudicial de obrigação pecuniária vencida, garantida por hipoteca, segue os termos do processo executivo sumário, atento o disposto no art. 550.º, n.º 2, al. b), do CPC.
 
 
 
  1. Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril
 
​​​​​​4.1. Âmbito
 
A Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril, veio, entretanto, alterar a redação dos n.ºs 1 e 5 a 13 do art. 7.º, bem como do art. 8.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março[17].
 
 
​​​​​​​4.2. Suspensão de prazos para a prática de atos processuais e procedimentais
 
Em primeiro lugar, procurando clarificar as dúvidas quanto à questão de saber se a aplicação do regime das férias judiciais à prática de atos processuais acarretava ou não a suspensão dos prazos correlativos, o legislador alterou a redação do n.º 1 do art. 7.º, nele passando a prever que, em regra, todos os prazos para a prática de atos processuais e procedimentais que devessem ser praticados no âmbito dos processos e procedimentos que corressem termos nos tribunais judiciais, nos tribunais administrativos e fiscais, no Tribunal Constitucional, no Tribunal de Contas e demais órgãos jurisdicionais, nos tribunais arbitrais, no Ministério Público, nos julgados de paz, nas entidades de resolução alternativa de litígios e nos órgãos de execução fiscal ficavam suspensos até que se verificasse a “cessação da situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARSCoV-2 e da doença COVID-19, a decretar nos termos do número seguinte”.
 Paralelamente, o n.º 12 do art. 7.º passou a estatuir que “Não são suspensos os prazos relativos à prática de atos realizados exclusivamente por via eletrónica no âmbito das atribuições do Instituto Nacional da Propriedade Industrial, I. P.”.
 
 
​​​​​​​4.3.  Tramitação de processos, prática de atos e proferimento de decisões
 
Não obstante a consagração da regra da suspensão dos prazos para a prática de atos processuais e procedimentais, o legislador procurou assegurar a possibilidade de os processos continuarem a ser tramitados e de serem praticados atos presenciais, desde que, por obediência e respeito ao princípio da igualdade, todas as partes declarassem estar em condições de recorrer a plataformas eletrónicas que viabilizassem tal possibilidade.
Assim, o art. 7.º, n.º 5, passou a determinar que o regime geral constante do n.º 1 – isto é, de suspensão dos prazos para a prática de atos processuais e procedimentais –, não obstava à tramitação dos processos e à prática de atos presenciais e não presenciais não urgentes quando todas as partes entendessem ter condições para assegurar a sua prática através das plataformas informáticas que possibilitassem a sua realização por via eletrónica ou através de meios de comunicação à distância adequados, designadamente teleconferência, videochamada ou outro equivalente. 
 Ademais, o citado preceito legal veio, igualmente, permitir o proferimento de decisão final nos processos em relação aos quais o tribunal e demais entidades entendessem não ser necessária a realização de novas diligências. Na verdade, não sendo, nesse caso, indispensável a presença física dos sujeitos processuais, nenhum motivo existia para que se obstasse ao proferimento das decisões judiciais, permitindo-se, dessa forma, minimizar as consequências decorrentes da paralisação, praticamente generalizada, da atividade dos tribunais.
 
 
​​​​​​​4.4. Suspensão de atos e prazos no processo de insolvência e no processo executivo
            
A redação do n.º 6 do art. 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, foi igualmente alterada, nele se passando a prever a suspensão de atos ou de prazos no processo de insolvência e no processo executivo.
Assim, no que concerne ao processo de insolvência, a al. a) do citado preceito legal passou a determinar a suspensão do “prazo de apresentação do devedor à insolvência, previsto no n.º 1 do artigo 18.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas”[18]. Na verdade, esta norma visou, essencialmente, garantir a proteção das empresas, particularmente num contexto de crise económica para a qual em nada contribuíram, bem como salvaguardar a sustentabilidade geral da economia portuguesa[19].
Por sua vez, em relação ao processo executivo, o art. 7.º, n.º 6, passou a estatuir a suspensão de “Quaisquer atos a realizar em sede de processo executivo, designadamente os referentes a vendas, concurso de credores, entregas judiciais de imóveis e diligências de penhora e seus atos preparatórios”. Com efeito, à semelhança da solução legislativa adotada em matéria de insolvência, esta medida visou proteger os executados, designadamente as empresas, atenta a situação económica difícil, decorrente da paralisação das atividades e dos mercados.
Em todo o caso, a suspensão das diligências executivas, apesar de proteger as empresas devedoras, era, igualmente, suscetível de prejudicar os credores, entre os quais, as empresas que fossem exequentes em processos executivos e que carecessem, rapidamente, de obter liquidez para poderem satisfazer os seus compromissos financeiros. Nessa exata medida, este regime de suspensão dos atos a serem realizados no processo executivo comportava uma exceção, já que dele ficavam excluídos os atos que fossem suscetíveis de causar um prejuízo grave à subsistência do exequente ou cuja não realização lhe pudesse provocar prejuízo irreparável, nos termos previstos no art. 137.º, n.º 2, do CPC, prejuízo esse que dependia de prévia decisão judicial.
 
 
​​​​​​​4.5. Processos urgentes
 
No que diz respeito aos processos urgentes, o n.º 7 do art. 7.º da Lei nº 1-A/2020, de 19 de março, invertendo a opção legislativa inicialmente adotada, constante do então n.º 5 do art. 7.º, passou a estatuir que os processos urgentes continuavam a ser tramitados, sem suspensão ou interrupção de prazos, atos ou diligências.
De todo o modo, por exigências de saúde pública e por forma a se minimizar os riscos de contágio, o legislador viria a estabelecer o seguinte regime processual quanto à realização das diligências:
      1. nas diligências em que fosse necessária a presença física das partes, dos seus mandatários ou de outros intervenientes processuais, a prática de quaisquer atos processuais e procedimentais realizava-se através de meios de comunicação à distância adequados, designadamente teleconferência, videochamada ou outro equivalente;
      2. se não fosse possível a realização das diligências que requeressem a presença física das partes, dos seus mandatários ou de outros intervenientes processuais, através de meios de comunicação à distância, e se estivesse em causa a vida, a integridade física, a saúde mental, a liberdade ou a subsistência imediata dos intervenientes, as diligências podiam ser realizadas de forma presencial, desde que não implicassem a presença de um número de pessoas superior ao previsto pelas recomendações das autoridades de saúde e de acordo com as orientações fixadas pelos conselhos superiores competentes;
      3. caso não fosse possível, nem adequado, assegurar a prática de atos ou a realização de diligências através de meios de comunicação à distância ou de forma presencial, aplicava-se também a esses processos o regime de suspensão de atos e prazos processuais, previsto no          n.º 1 do art. 7.º.
Paralelamente, importa salientar que o n.º 8 do art. 7.º veio estatuir que, para efeitos de aplicação desse regime excecional, consideram-se também urgentes:
      1. os processos e procedimentos para defesa dos direitos, liberdades e garantias lesados ou ameaçados de lesão por quaisquer providências inconstitucionais ou ilegais, referidas no art.
6.º da Lei n.º 44/86, de 30 de setembro, na sua redação atual;
      1. o serviço urgente previsto no art. 53.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de março, na sua redação atual; e
      2. os processos, procedimentos, atos e diligências que se revelassem necessários a evitar a produção de um dano irreparável, designadamente os processos relativos a menores em risco ou a processos tutelares educativos de natureza urgente e as diligências e julgamentos de arguidos presos[20].
 
​​​​​​​4.6. Aplicação subsidiária: suspensão dos prazos nos procedimentos e processos administrativos e tributários
 
Quanto ao n.º 9 do art. 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, o mesmo foi igualmente alterado, no sentido de permitir a aplicação, com as necessárias adaptações, do regime excecional constante do art. 7.º à prática de atos:
      1. em procedimentos que corressem os seus termos em cartórios notariais e conservatórias;
      2. em procedimentos contraordenacionais, sancionatórios e disciplinares, incluindo os atos de impugnação judicial de decisões finais ou interlocutórias, que corram termos em serviços da administração direta, indireta, regional e autárquica, e demais entidades administrativas, designadamente entidades administrativas independentes, incluindo a Autoridade da Concorrência, a Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões, o Banco de Portugal e a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, bem como os que corram termos em associações públicas profissionais; e
      3. em procedimentos administrativos e tributários, relativamente à prática de atos por particulares[21][22]
 
​​​​​​​4.7. Proteção dos arrendatários
 
A proteção dos arrendatários viria, novamente, a merecer a atenção do legislador, mediante a consagração de dois regimes excecionais.
Assim, por um lado, foi alterada a redação do n.º 11 do art. 7.º – referente à suspensão de processos e de procedimentos –, nele se passando a dispor que, durante a situação excecional referida no n.º 1, ficavam suspensas as ações de despejo, os procedimentos especiais de despejo e os processos para entrega de coisa imóvel arrendada, nos casos em que o arrendatário, por força da decisão judicial final a ser proferida nesses processos, pudesse ser colocado numa situação de fragilidade, por falta de habitação própria ou por outra razão social imperiosa.
 Por outro lado, no que diz respeito ao regime extraordinário e transitório de proteção dos arrendatários, constante do art. 8.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, o legislador veio esclarecer que “Durante a vigência das medidas de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, conforme determinada pela autoridade de saúde pública e até 60 dias após a cessação de tais medidas nos termos do n.º 2 do artigo 7.º da presente lei”[23], ficavam suspensas, para além da produção de efeitos das denúncias de contratos de arrendamento habitacional e não habitacional efetuadas pelo senhorio, assim como a execução de hipoteca sobre imóvel que constituísse habitação própria e permanente do executado:
    1. a caducidade dos contratos de arrendamento habitacionais e não habitacionais, salvo
se o arrendatário não se opusesse à cessação dos mesmos;
    1. a produção de efeitos da revogação, da oposição à renovação de contratos de
arrendamento habitacional e não habitacional efetuadas pelo senhorio; e
    1. o prazo indicado no art. 1053.º do CC, se o fim desse prazo ocorresse durante o período
de tempo em que vigorassem as referidas medidas.

 
4.8. Contratação Pública
 
Paralelamente, o art. 3.º da Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril, aditou à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, o art. 7.º-A, com a seguinte redação:
“1 - A suspensão de prazos prevista no n.º 1 do artigo anterior não se aplica ao contencioso pré-contratual previsto no Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
    1.  - A suspensão dos prazos administrativos previstos na alínea c) do n.º 9 do artigo anterior não é aplicável aos prazos relativos a procedimentos de contratação pública, designadamente os constantes do Código dos Contratos Públicos, aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de janeiro.
    2. - Os prazos procedimentais no âmbito do Código dos Contratos Públicos que estiveram suspensos por força dos artigos 7.º e 10.º da presente lei, na sua redação inicial, retomam a sua contagem na data da entrada em vigor da Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril”.
 

 
  1. Lei n.º 9/2020, de 10 de abril
 
 A Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, veio estabelecer um regime excecional de flexibilização da execução das penas e das medidas de graça, no âmbito da pandemia da doença COVID-19, tendo entrado em vigor no dia 11 de abril de 2020[24].
 Em matéria de prazos, importa salientar que, em relação à “Prisão preventiva e reclusos especialmente vulneráveis”, o art. 7.º, n.º 1, veio impor ao juiz a obrigação de proceder ao reexame dos pressupostos da aplicação da medida de coação de prisão preventiva, independentemente do decurso do prazo de três meses previsto no art. 213.º do Código de Processo Penal, sobretudo quando os arguidos estivessem em alguma das situações descritas no art. 3.º, n.º 1[25], de modo a reponderar a necessidade da medida, avaliando, nomeadamente, a efetiva subsistência dos requisitos gerais previstos no art. 204.º do Código de Processo Penal[26].
 
 
  1. Lei n.º 10/2020, de 18 de abril
 
Entretanto, a Lei n.º 10/2020, de 18 de abril – a qual entrou em vigor no dia seguinte ao da sua publicação –, veio fixar um “regime excecional e temporário quanto às formalidades da citação e da notificação postal previstas nas leis processuais e procedimentais e quanto aos serviços de envio de encomendas postais, atendendo à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e à doença COVID-19” (art. 1.º).
 No prosseguimento desse desiderato, o art. 2.º do citado diploma legal estabeleceu o seguinte regime, ainda vigente:
      1. suspensão da recolha da assinatura na entrega de correio registado e encomendas até à cessação da situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19 (art. 2.º, nº 1);
      2. substituição da recolha da assinatura pela identificação verbal e recolha do número do cartão de cidadão, ou de qualquer outro meio idóneo de identificação, mediante a respetiva apresentação e aposição da data em que a recolha seja efetuada (art. 2.º, n.º 2);
      3. em caso de recusa de apresentação e fornecimento do número do cartão de cidadão ou de qualquer outro meio idóneo de identificação, o distribuidor do serviço postal deve lavrar nota do incidente na carta ou aviso de receção e devolvê-lo à entidade remetente (art. 2.º, n.º 3), sendo que, nesse caso, independentemente do processo ou do procedimento, o ato de certificação da ocorrência vale como citação ou notificação, consoante os casos (art. 2.º, n.º 4)[27];
      4. sem prejuízo do regime especial aplicável aos casos de recusa, as citações e notificações realizadas através de remessa de carta registada com aviso de receção consideramse efetuadas na data em que seja recolhido o número de cartão de cidadão ou de qualquer outro meio legal de identificação (art. 2.º, n.º 5);
      5. aplicação subsidiária deste regime, com as devidas adaptações, às citações e notificações realizadas por contacto pessoal (art. 2.º, n.º 6).
 
  1. Decreto-lei n.º 20/2020, de 1 de maio
 
Posteriormente, o Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de maio – o qual entrou em vigor no dia 2 de maio de 2020 –, veio alterar o Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, mediante o aditamento, a esse diploma, de diversos preceitos legais.
 No que concerne à matéria que nos ocupa, há a salientar o aditamento do art. 15.º-A[28], o qual veio estabelecer que a assinatura dos outros juízes que, para além do relator, tenham intervindo em tribunal coletivo, nos termos do art. 153.º, n.º 1, do CPC, pode ser substituída por declaração escrita do relator, atestando o voto de conformidade dos juízes que não assinaram.

 
  1. Lei n.º 16/2020, de 29 de maio
 
​​​​​​​8.1. Âmbito
 
 A Lei n.º 16/2020, de 29 de maio – a qual entrou em vigor no dia 3 de junho de 2020[29]
–, alterou, novamente, quer a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março[30], quer o Decreto-Lei n.º 10A/2020, de 13 de março[31].
 Com efeito, conforme se extrai do preâmbulo da Proposta de Lei n.º 30/XIV – a qual esteve na base deste diploma legal – o legislador procurou permitir “o alívio de certas medidas entretanto adotadas, com vista a iniciar o processo gradual de retoma de alguma normalidade em algumas atividades, sem que isso deva colocar em causa a evolução positiva que se tem verificado em Portugal no combate à COVID-19”. O mesmo é dizer que este diploma legal visou, fundamentalmente, adotar um conjunto de regras que permitissem o descongestionamento progressivo da Justiça, em geral, e da atividade dos tribunais, em particular, sem, no entanto, descurar as preocupações das autoridades, nacionais e internacionais, de saúde, em matéria de combate e de controlo da evolução pandémica do COVID-19.
Vejamos, então, quais foram as medidas adotadas no prosseguimento desse desiderato.

 
​​​​​​8.2. Regime processual transitório e excecional
 
No que concerne à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, foi-lhe aditado o art. 6.º-A, o qual veio estabelecer um regime processual transitório e excecional.
            

8.2.1. Levantamento da suspensão dos prazos
 
Conforme se referiu supra, o art. 7.º, n.º 1, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, consagrava a regra segundo a qual todos os prazos para a prática de atos processuais e procedimentais que devessem ser praticados no âmbito dos processos e procedimentos que corressem termos nos tribunais judiciais, nos tribunais administrativos e fiscais, no Tribunal Constitucional, no Tribunal de Contas e demais órgãos jurisdicionais, nos tribunais arbitrais, no Ministério Público, nos julgados de paz, nas entidades de resolução alternativa de litígios e nos órgãos de execução fiscal ficavam suspensos até à cessação da situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID19.
Sucede que o art. 8.º da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, revogou esse preceito legal[32]. Significa isto que, por força dessa revogação, tal redundou no levantamento da suspensão dos prazos para a prática de atos processuais e procedimentais.
Simplesmente, ao invés da técnica legislativa adotada em outros ordenamentos jurídicos – designadamente nos ordenamentos espanhol e francês – o legislador não consagrou qualquer regra em relação à data a partir da qual se verificou o reinício da contagem dos prazos ou sequer quanto à forma de cômputo dos prazos.
 Coloca-se, por isso, o problema de saber a partir de que momento os prazos para a prática de atos processuais e procedimentais voltaram a correr os seus termos e, bem isso, de que modo esses prazos devem ser computados.
 Em relação ao primeiro dos identificados problemas, dado que, nos termos do art. 10.º da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, este diploma legal entrou em vigor no quinto dia seguinte ao da sua publicação, ou seja, no dia 3 de junho de 2020, tal significa que, nessa data, os prazos para a prática de atos processuais ou procedimentais, que até então, se encontravam suspensos, retomaram a sua contagem. 
Já no que diz respeito ao cômputo do prazo, dado que esses prazos se encontravam suspensos e que o legislador não fixou qualquer regime transitório para o cômputo dos prazos, tal significa que os prazos retomaram a sua contagem a partir do ponto em que tinham ficado suspensos.
Repare-se que, neste particular, a solução portuguesa afastou-se claramente da solução que viria a ser perfilhada nos ordenamentos jurídicos espanhol e francês, nos quais o legislador optou por aplicar, quanto ao cômputo dos prazos, o regime da interrupção dos prazos, donde decorre que os prazos começam a contar ex novo. Na nossa perspetiva, esta solução favorece claramente a segurança e a estabilidade jurídicas e tem a virtualidade de conceder uma “moratória” quanto ao normal restabelecimento da atividade dos tribunais, que, lateralmente, se veem forçados a retomar a tramitação dos processos judiciais e a adotar medidas técnicas que garantam a proteção da saúde.
 

8.2.2. Realização de diligências
 
Relativamente à realização de diligências, o n.º 1 do art. 6.º-A veio estipular que, no decurso da situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, as diligências a realizar no âmbito dos processos e procedimentos que corram termos nos tribunais judiciais, nos tribunais administrativos e fiscais, no Tribunal Constitucional, no Tribunal de Contas e demais órgãos jurisdicionais, nos tribunais arbitrais, no Ministério Público, nos julgados de paz, nas entidades de resolução alternativa de litígios e nos órgãos de execução fiscal passam a reger-se por um novo regime excecional e transitório. 
No prosseguimento desse objetivo, o legislador veio restabelecer a realização generalizada das diligências judiciais[33], distinguindo, no entanto, quanto aos moldes da sua realização, em função do tipo e/ou do objeto da diligência.

 
8.2.2.1. Audiência de discussão e julgamento ou diligência que importe a inquirição de testemunhas
 
Estando em causa uma audiência de discussão e julgamento ou uma diligência que importe a inquirição de testemunhas – tal como sucede, por exemplo, com a produção antecipada de prova (art. 419.º do CPC) –, a mesma:
a)   em regra, realiza-se presencialmente e com a observância do limite máximo de pessoas e demais regras de segurança, de higiene e sanitárias definidas pela Direção-Geral da Saúde;
b) excecionalmente, se a diligência não puder ser realizada de forma presencial e se tal for possível e adequado, nomeadamente se não causar prejuízo aos fins da realização da justiça[34], a mesma poderá ter lugar através de meios de comunicação à distância que se revelem adequados, designadamente teleconferência, videochamada ou outro equivalente. De todo o modo, neste caso, a prestação de declarações do arguido ou de depoimento das testemunhas ou de parte deve ser sempre feita num tribunal[35], salvo acordo das partes em sentido contrário ou verificando-se uma das situações referidas no n.º 4 do art. 6.º-A.
 

8.2.2.2. Outras diligências que requeiram a presença física das partes, mandatários ou intervenientes processuais
 
Estando em causa outras diligências que requeiram a presença física das partes, dos seus mandatários ou de outros intervenientes processuais – tal como sucede, por exemplo, com a audiência prévia (art. 591.º do CPC) –, a prática de quaisquer outros atos processuais e procedimentais obedece aos seguintes termos[36]:
  1. regra geral, realiza-se através de meios de comunicação à distância adequados, designadamente teleconferência, videochamada ou outro equivalente; 
  2. excecionalmente, se não for possível a realização da diligência através de meios de comunicação à distância, a mesma tem lugar em moldes presenciais, desde que com respeito pelo limite máximo de pessoas e demais regras de segurança, higiene e sanitárias definidas pela Direção-Geral da Saúde.

 
8.2.2.3. Apreciação crítica
 
Tendo o legislador estabelecido dois regimes distintos quanto ao modo como as diligências devem ser realizadas – isto é, presencialmente ou através de meios de comunicação à distância – a questão que se coloca é a de saber se fará sentido essa duplicação de regimes.
Antecipando a nossa resposta a essa questão, diremos, desde já, que a mesma é negativa.
Com efeito, ao invés da duplicação de regimes, parece-nos que teria sido preferível que o legislador português, à semelhança da solução adotada, por exemplo, no ordenamento jurídico espanhol, tivesse enveredado por um modelo de primazia dos meios de comunicação à distância, reservando a realização de diligências presenciais para situações excecionais, em que a tutela dos direitos fosse incompatível com o emprego de meios de comunicação à distância.
Na verdade, a adoção, como regra, de um modelo de realização de diligências à distância permitiria, desde logo, ir ao encontro das recomendações das autoridades de saúde pública quanto à prevenção de contágio por COVID-19.
Ademais, sendo o processo judicial tramitado por via eletrónica (art. 132.º do CPC) e estando perfeitamente instituída a possibilidade de inquirição através de teleconferência, com respeito pelo princípio da imediação (cfr. os arts. 456.º e 486.º do CPC), não se percebe por que razão o legislador veio, mesmo assim, insistir na realização generalizada de diligências em moldes presenciais.
De resto, não se pode descurar que essa solução encontra limitações na própria capacidade de resposta e/ou de adequação dos meios físicos dos tribunais às medidas impostas pelas autoridades de saúde em matéria de prevenção de contágio da doença COVID-19. 
Nem se diga, por outro lado, que a generalização da realização das audiências finais ou das diligências que importem a inquirição de testemunhas de forma presencial tem em vista garantir a observância do princípio da imediação e/ou salvaguardar a formação da convicção do julgador quanto ao valor da prova produzida.
É que, não se pode ignorar que a produção de um depoimento por alguém cuja face se encontra parcialmente oculta, por razões de saúde pública, não deixa de constituir um entrave à captação, pelo julgador, das expressões faciais de quem depõe, o que assume particular relevância no momento da valoração da prova e da motivação da decisão judicial[37]. Ora, tal limitação, associada às dificuldades de adaptação dos espaços físicos dos tribunais ao respeito pelas limitações impostas pelas autoridades de saúde, poderia ser facilmente ultrapassada se a audiência final e/ou de inquirição de testemunhas fosse, em regra, realizada de forma não presencial.
Outrossim, não se pode deixar de questionar se a realização de audiências finais e/ou de diligências de inquirição de testemunhas em moldes presenciais, mas com limitação do número máximo de pessoas que podem estar presentes na sala de audiências, não colidirá com o princípio da publicidade da audiência (art. 606.º, n.º 1)[38], o qual, pelo contrário, poderia ser garantido através da realização da audiência através de meios de comunicação à distância, com a disponibilização pública do respetivo endereço eletrónico de acesso a essa diligência.

 
8.2.2.4. Direito de não deslocação e prerrogativas de inquirição
 
Nos termos do n.º 4 do art. 6.º-A, independentemente do tipo de diligência, isto é, de estar em causa uma audiência de discussão e julgamento, uma diligência que implique a inquirição de testemunhas ou outro tipo de diligência, as partes, os seus mandatários ou outros intervenientes processuais que, comprovadamente, sejam maiores de 70 anos de idade, imunodeprimidos ou portadores de doença crónica que, de acordo com as orientações da autoridade de saúde, devam ser considerados de risco[39], não têm obrigação de se deslocar a um tribunal.
Nessa eventualidade, em caso de efetivação do direito de não deslocação, a respetiva inquirição ou acompanhamento da diligência realiza-se através de meios de comunicação à distância adequados, designadamente teleconferência, videochamada ou outro equivalente, a partir do seu domicílio legal ou profissional[40].
Nessa hipótese, a diligência poderá ser realizada presencialmente, mas a pessoa que beneficie dessa prerrogativa poderá ser inquirida e/ou acompanhar a diligência à distância.
A consagração deste regime não deixa de colocar o problema de saber se o mesmo não violará os princípios da igualdade de armas, da imediação e da audiência contraditória. Basta pensar, por hipótese, na eventualidade de um dos mandatários se encontrar a assistir à audiência, de forma presencial, no tribunal, enquanto o outro acompanha essa diligência à distância.
Ora, não podendo a resposta a esse problema deixar de ser afirmativa, tal vem, mais uma vez, colocar em evidência que teria sido preferível que o legislador nacional tivesse enveredado por um modelo regra de realização de audiências à distância.
 

8.2.2.5. Diligências em processos penais
 
À luz do n.º 5 do art. 6.º-A, sem prejuízo do regime geral consagrado nesse preceito, o arguido goza do direito de estar presente no debate instrutório e na sessão de julgamento, quando tiver lugar a prestação de declarações do arguido ou coarguido e o depoimento de testemunhas. 
A aplicação deste regime pressupõe, por conseguinte, que a diligência seja realizada em moldes presenciais e, bem assim, que o arguido manifeste a sua intenção no sentido de estar presente no debate instrutório e na sessão de julgamento, quando tiver lugar a prestação de declarações do arguido ou coarguido, bem como o depoimento de testemunhas[41].
 

8.2.3. Suspensão de atos e de prazos processuais
 
No decurso do período de vigência do regime excecional e transitório, ficam suspensos diversos atos e prazos[42], conforme melhor se aduzirá infra.
 
 
8.2.3.1. Apresentação do devedor à insolvência
 
Nos termos do art. 6.º-A, n.º 6, al. a), fica suspenso o prazo de apresentação do devedor à insolvência, previsto no art. 18.º, n.º 1, do Código da Insolvência e da Recuperação de
Empresas[43].
Repare-se, em todo o caso, que esta solução legal, apesar de ser importante quanto à proteção das pessoas, singulares e coletivas, que, por força da pandemia, se viram subitamente numa situação económica debilitada, não as acautela de forma absoluta, pois que não inibe que qualquer uma das pessoas a quem a lei reconhece legitimidade ativa (art. 20.º do CIRE) requeira a insolvência do devedor.
 

8.2.3.2. Proteção da casa de morada de família
 
Apesar de, em regra, terem deixado de ficar suspensos os prazos e atos a ser praticados no âmbito do processo executivo, o certo é que, à luz do art. 6.º-A, n.º 6, al. b), ficam suspensos os atos a ser realizados em sede de processo executivo ou de insolvência, que se encontrem “relacionados com a concretização de diligências de entrega judicial da casa de morada de família”.
Neste particular, coloca-se a questão de saber como deve ser interpretada a expressão “atos relacionados com a concretização de diligências de entrega judicial da casa de morada de família”, isto é, se estarão aqui apenas em causa os atos materiais de entrega coerciva de um bem imóvel, ou, pelo contrário, se essa expressão abrangerá todos os atos preparatórios dessa diligência, designadamente a realização da venda e as diligências subsequentes.
Com efeito, se confrontarmos a redação do art. 6.º-A, n.º 6, al. b) – onde se alude a atos “relacionados com a concretização de diligências de entrega judicial da casa de morada de família” – com a do n.º 7 do mesmo preceito legal – onde, pelo contrário, o legislador se refere a “atos a realizar em sede de processo executivo ou de insolvência referentes a vendas e entregas judiciais de imóveis” –, dir-se-á que o art. 6.º-A, n.º 6, al. b), aplicar-se-á tão-só às diligências executivas praticadas na ação executiva para pagamento de quantia certa, tendentes à entrega de bem imóvel que tenha sido vendido e que constitua a casa de morada de família do executado, bem como às ações executivas para entrega de coisa certa, que tenham igualmente por objeto esse bem.
Ainda a este respeito, importa referir que a Proposta de Lei n.º 30/XIV previa um âmbito mais alargado, já que a redação projetada para o art. 6.º-A, n.º 2, al. a), aludia à suspensão de “Quaisquer atos a realizar em sede de processo executivo ou de insolvência, designadamente os referentes a vendas, entregas judiciais de imóveis e diligências de penhora e seus atos preparatórios, suscetíveis de causar prejuízo à subsistência do executado ou do declarado insolvente, ou por outra razão social imperiosa”. Complementarmente, o art. 6.º-A, n.º 3, da Proposta de Lei n.º 30/XIV, excetuava da aplicação deste regime os atos que fossem suscetíveis de causar “prejuízo grave à subsistência do exequente” ou cuja realização fosse passível de lhe provocar um “prejuízo irreparável, nos termos previstos no n.º 2 do artigo 137.º do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, na sua redação atual, prejuízo esse que depende de prévia decisão judicial”.
Por outro lado, de acordo com o art. 6.º-A, n.º 6, al. c) do citado preceito legal, ficam igualmente suspensas “as ações de despejo, os procedimentos especiais de despejo e os processos para entrega de coisa imóvel arrendada, quando o arrendatário, por força da decisão judicial final a proferir, possa ser colocado em situação de fragilidade por falta de habitação própria ou por outra razão social imperiosa”.
De facto, tal como sucede com a suspensão do ato de entrega de bem imóvel, que constitua a casa de morada de família, no âmbito das ações executivas, esta medida encontra justificação na necessidade de se obviar a que o arrendatário e o seu agregado familiar se vissem, subitamente, sem um lugar onde viver, em contradição com o dever geral de recolhimento imposto pelas autoridades de saúde.
 

8.2.4. Suspensão de prazos de prescrição e de caducidade
 
Nos termos do art. 6.º-A, n.º 6, als. d) e e), ficam suspensos:
  • os prazos de prescrição e de caducidade relativos aos processos e procedimentos referidos nas alíneas anteriores, ou seja, os prazos de prescrição e de caducidade relativos aos processos de insolvência que não se iniciem por força da suspensão do prazo de apresentação do devedor à insolvência, aos processos executivos, às ações de despejo, aos procedimentos especiais de despejo e aos processos para entrega de coisa imóvel arrendada;
  • os prazos de prescrição e de caducidade relativos aos processos cujas diligências não possam ser feitas nos termos da alínea b) do n.º 2 – isto é, através de meios de comunicação à distância, quando estejam em causa audiências de julgamento ou diligências que importem a inquirição de testemunhas –, da alínea b) do n.º 3 – ou seja, presencialmente, quando estejam em causa diligências que requeiram a presença física das partes, dos seus mandatários ou de outros intervenientes processuais –, ou do n.º 7, isto é, nos casos em que os atos a realizar em sede de processo executivo ou de insolvência, referentes a vendas e entregas judiciais de imóveis, sejam suscetíveis de causar prejuízo à subsistência do executado ou do declarado insolvente e este tenha requerido, de forma procedente, a suspensão da prática desses atos[44].
Por outro lado, importa salientar que, à luz do n.º 8 do mesmo preceito legal, este regime excecional de suspensão dos prazos de prescrição ou de caducidade prevalece sobre quaisquer regimes que estabeleçam prazos máximos imperativos de prescrição ou caducidade, sendo os mesmos alargados pelo período de tempo correspondente à vigência da suspensão.
 

8.2.5. Suspensão de atos referentes a vendas e a entregas judiciais de imóveis
 
De acordo com o art. 6.º-A, n.º 7, se os atos a realizar em sede de processo executivo ou de insolvência, referentes a vendas ou entregas judiciais de bens imóveis – que não constituam a casa de morada de família do executado –, forem suscetíveis de causar prejuízo à subsistência do executado ou do declarado insolvente – tal como sucede, por exemplo, com a entrega de um bem imóvel no qual o executado ou o insolvente desenvolvam uma determinada atividade profissional ou laboral –, este pode requerer a suspensão da prática desses atos, desde que essa suspensão não cause prejuízo grave à subsistência do exequente ou um prejuízo irreparável. Com efeito, o legislador teve em atenção a circunstância de a crise pandémica e subsequente quebra de rendimentos das famílias e das empresas ser suscetível de afetar não só a situação económica dos executados, mas também dos exequentes.
Esse incidente, uma vez ouvidas as partes, deve ser decidido no prazo de 10 dias. Trata-se, em todo o caso, de um prazo meramente ordenador, razão pela qual, da violação desse prazo, não decorrer qualquer nulidade processual.
Por outro lado, no que concerne ao efeito processual da dedução desse incidente, importa salientar que, ainda que a lei seja omissa, esse efeito não poderá deixar de ser suspensivo. Na verdade, tendo em conta o âmbito e a finalidade da diligência, o incidente só produzirá efeito útil desde que a execução do ato referente à venda ou à entrega judicial do imóvel fique a aguardar pela decisão que nele vier a ser proferida.
 

8.2.6. Condições de segurança e de salubridade
 
Nos termos do art. 6.º-A, n.º 9, os serviços dos estabelecimentos prisionais devem, em conformidade com as orientações das autoridades de saúde pública e da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais em matéria de normas de segurança, de higiene e sanitárias, assegurar as condições necessárias para que os respetivos defensores possam conferenciar presencialmente com os arguidos para preparação da defesa[45].
Paralelamente, de acordo com o n.º 10 do mesmo preceito legal, os tribunais e as demais entidades referidas no n.º 1 – maxime o Ministério Público, os julgados de paz, as entidades de resolução alternativa de litígios e os órgãos de execução fiscal – devem estar dotados dos meios de proteção e de higienização desinfetantes determinados pelas recomendações da Direção Geral de Saúde.

 
8.3. Justo impedimento
            
No que diz respeito ao Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, a Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, aditou um n.º 4 ao art. 14.º daquele diploma legal, nele se passando a dispor que a declaração referida no n.º 1, isto é, a declaração emitida por uma autoridade de saúde, a favor de sujeito processual, parte, seus representantes ou mandatários, que ateste a necessidade de um período de isolamento destes por eventual risco de contágio do COVID-19 considera-se também, para todos os efeitos, fundamento para a alegação do justo impedimento à prática de atos processuais e procedimentais que possam ser praticados remotamente quando o sujeito não tenha acesso a meios de comunicação à distância ou esteja incapacitado por infeção por COVID19 para os praticar, no âmbito dos processos, procedimentos, atos e diligências que corram os seus termos nos tribunais judiciais, tribunais administrativos e fiscais, tribunais arbitrais, Ministério Público, julgados de paz, entidades de resolução alternativa de litígios, cartórios notariais, conservatórias ou serviços e entidades administrativas, no âmbito de procedimentos contraordenacionais, respetivos atos e diligências e no âmbito de procedimentos, atos e diligências regulados pelo Código do Procedimento Administrativo[46].
 

8.4. Prazos administrativos 
 
Por outro lado, a Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, introduziu importantes alterações em matéria de prazos substantivos.
Assim, o art. 5.º, n.º 1, veio estabelecer que os prazos administrativos cujo termo “original”[47] ocorreria durante a vigência do regime de suspensão estabelecido pelo art. 7.º da Lei n.º 1 -A/2020, de 19 de março, na sua redação original e na redação dada pela Lei n.º 4 -A/2020, de 6 de abril, consideram-se vencidos no vigésimo dia útil posterior à entrada em vigor da presente lei (3 de junho de 2020), ou seja, no dia 3 de julho de 2020. Por conseguinte, no que concerne aos prazos administrativos que terminariam até ao dia 3 de junho de 2020, o termo do prazo, face à revogação do regime de suspensão estabelecido pelo art. 7.º da Lei n.º 1 -A/2020, de 19 de março, é prorrogado até ao dia 3 de julho de 2020.
Diversamente, os prazos administrativos cujo termo original ocorreria após a entrada em vigor da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, isto é, depois do dia 3 de junho de 2020, caso a suspensão estabelecida pelo art. 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março não tivesse tido lugar, consideram-se vencidos[48]:
  1. no vigésimo dia útil posterior à entrada em vigor da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio,
ou seja, no dia 3 de julho de 2020, caso se vencessem até essa data; ou
  1. na data em que se venceriam originalmente caso se vencessem em data posterior ao vigésimo dia útil posterior à entrada em vigor da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, ou seja, após o dia 3 de julho de 2020.
De todo o modo, este regime excecional não se aplica aos prazos das fases administrativas em matéria contraordenacional.
 

8.5. Prazos de prescrição e de caducidade
 
Já no que diz respeito aos prazos de prescrição e de caducidade, o art. 6.º preceitua que os prazos de prescrição e caducidade que deixem de estar suspensos por força das alterações introduzidas pela Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, são alargados pelo período de tempo em que vigorou a sua suspensão.
Esta norma tem o seu correspondente no revogado art. 7.º, n.º 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, o qual estabelecia que o regime de suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os processos e procedimentos prevalecia sobre quaisquer regimes que fixassem prazos máximos imperativos de prescrição ou caducidade, sendo os mesmos alargados pelo período de tempo em que vigorasse a situação excecional.
Vale isto pode dizer que, se à data de 10 de março de 2020, estava em curso a contagem de um prazo de prescrição de três anos, a partir da entrada em vigor da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, esse prazo retoma a sua contagem e beneficia do aumento da sua duração, sendo esse aumento computado em função do período de tempo em que durou a suspensão do prazo. Assim, se, no dia 10 de março, faltavam, por hipótese, 20 dias para o termo de um prazo de prescrição ou de caducidade, com a entrada em vigor da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, retoma a contagem desse prazo de prescrição ou de caducidade, contando-se, no entanto, não só os 20 dias que faltavam para a verificação do seu termo, como também o período de tempo em que vigorou, a título excecional, a suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade[49].

 
 
  1. Decreto-Lei n.º 24-A/2020, de 29 de maio
 
​​​​​​​9.1. Âmbito
 
O Decreto-Lei n.º 24-A/2020, de 29 de maio – o qual entrou em vigor no dia 30 de maio de 2020 –, veio alterar as medidas excecionais e temporárias relativas à pandemia da doença COVID-19.
No que em particular se refere ao objeto da presente exposição, importa salientar que este diploma legal introduziu alterações relevantes, quer em matéria de proteção dos consumidores, quer no tocante à realização de diligências periciais por junta médica.
 
 
​​​​​​9.2. Proteção dos consumidores
            
Em matéria de proteção dos consumidores, o Decreto-Lei n.º 24-A/2020, de 29 de maio, aditou ao Decreto-Lei n.º 10-A/2020, o art. 18.º-A, o qual, sob a epígrafe “Prorrogação dos prazos para o exercício de direitos do consumidor”, veio estabelecer que os prazos para o exercício de direitos previstos no artigo 5.º-A do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de abril, na sua redação atual – isto é, os prazos para o exercício dos direitos que assistem ao consumidor, em caso de falta de conformidade do bem com o contrato – cujo termo se tenha verificado entre os dias 18 de março de 2020 e 31 de maio de 2020, são prorrogados até ao dia 30 de junho de 2020.
 
 
​​​​​​​9.3. Perícias por junta médica
 
Por sua vez, no que concerne à realização de perícias por junta médica, o Decreto-Lei n.º 24-A/2020, de 29 de maio, aditou ao Decreto-Lei n.º 10-A/2020, o art. 35.º-L, o qual veio estabelecer o seguinte regime:
a) as perícias por junta médica, que sejam solicitadas pelas autoridades judiciárias, ao abrigo do disposto no art. 139.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, são realizadas exclusivamente nas instalações das delegações do INMLCF, I. P., gabinetes médico-legais ou hospitais;
b) o magistrado pode presidir às diligências através de plataformas informáticas que possibilitem a sua realização por via eletrónica ou através de meios de comunicação à distância, designadamente teleconferência, videochamada ou equivalente, sendo que, se as diligências forem efetuadas através de meio de comunicação à distância, o respetivo auto é assinado apenas pelo magistrado que preside à diligência.
Este regime jurídico, apesar de ser importante no atual contexto pandémico, não deixa, no entanto, de ficar aquém daquilo que seria desejável.
Na verdade, se, numa perspetiva de direito comparado, recorrermos, mais uma vez, às soluções que foram adotadas no ordenamento jurídico espanhol – no qual se estabeleceu a regra segundo a qual as perícias médico-legais são, sempre que possível, realizadas através de documentos, facilmente se percebe que a solução adotada pelo nosso legislador não deixa de obrigar à deslocação de pessoas e, consequentemente, ao maior risco de contágio e de propagação da doença.
 


Conclusão
 
Numa abordagem geral, a resposta dada pelo legislador, no domínio da justiça, às consequências jurídicas que resultaram da pandemia COVID-19 afigura-se francamente negativa.  Na verdade, é bem certo que o legislador viu-se forçado a responder, de forma muito rápida, a um cenário pandémico para o qual ninguém estava preparado.
Em todo o caso, a sucessão de diplomas legais num curto período de tempo, associada, em termos gerais, a uma má técnica legislativa – maxime quanto à redação do texto da lei, à duplicação de regimes jurídicos e à falta de clareza quanto à data da produção de efeitos dos diversos diplomas – acabou por contribuir para uma maior instabilidade e insegurança no domínio da justiça, que se juntou à instabilidade já verificada no contexto económico e social.
Por outro lado, é bem nítida a falta de uma linha estratégica, de médio ou longo prazo, para a reabertura dos tribunais e para a reativação do seu normal funcionamento.
Seria, por isso, importante que o legislador português avançasse, de imediato, no mesmo caminho que foi traçado, por exemplo, no ordenamento jurídico espanhol, através do Real DecretoLey n.º 16/2020, de 28 de abril, tendo em conta o previsível aumento da litigância judicial, bem como a necessidade de se garantir a segurança jurídica em matéria de cômputo de prazos.  Na verdade, de entre as medidas adotadas pelo referido diploma legal, há a destacar, em traços gerais:
  • a revisão do período de férias judiciais, visando a rápida recuperação dos processos judiciais cuja tramitação ficou prejudicada, tendo o legislador espanhol considerado como “dias hábeis” para a prática de atos processuais o período de tempo compreendido entre os dias 11 e 31 de agosto. Diversamente, no nosso ordenamento jurídico, apesar de o art. 7.º, n.º 11, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março (na sua redação original), prever que a Assembleia da República devia proceder à adaptação, através de diploma próprio, dos períodos de férias judiciais a vigorar em 2020, o certo é que, como vimos, o art. 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, foi revogado, tendo, por conseguinte, ficado prejudicada a revisão, nele prevista, do período de férias judiciais a vigorar no ano de 2020;
  • a definição de regras objetivas que permitam acautelar a certeza jurídica quanto ao reinício da contagem dos prazos que ficaram suspensos[50],.
  • o alargamento dos prazos para a interposição de recurso, em relação a decisões judiciais que tenham sido notificadas às partes aquando da suspensão dos prazos ou nos 20 dias úteis seguintes ao levantamento da suspensão dos prazos, obviando-se, dessa forma, à sobrecarga do sistema judicial com a interposição de recursos de forma massiva[51];
  • a adoção de um procedimento especial no âmbito do direito da família, tendo por finalidade restabelecer o equilibro entre os progenitores em matéria de visita de menores, devido à imposição de medidas de confinamento, bem como a litigância relativa ao incumprimento das obrigações alimentares em consequência das dificuldades económicas decorrentes da pandemia;
  • a proteção do devedor quanto a processos de insolvência[52];
  • a primazia na celebração de diligências processuais por via telemática, tendo em vista a proteção da saúde das pessoas e a minimização do risco de contágio[53]; e
  • a agilização das perícias médico-legais, permitindo-se que as mesmas sejam realizadas, sempre que possível, mediante a simples análise de documentos.
 Em conclusão, é fácil adivinhar que a forma lacunosa e imperfeita como o legislador respondeu, no domínio da justiça, aos desafios impostos pelo surto pandémico do COVID-19, associada à ausência de uma linha estratégica para a reativação do sistema judicial, redundará, nos próximos tempos, numa sucessão de dificuldades, por parte dos operadores judiciários, quanto à interpretação do sentido e do alcance dos sucessivos diplomas que foram sendo aprovados num curto período de tempo em matéria de atos processuais e de prazos – com o consequente aumento da litigiosidade nesse âmbito –, bem como ao maior congestionamento da atividade dos tribunais, os quais, na ausência de medidas estruturais – como seja a imediata revisão, a título excecional, do período de férias judiciais no corrente ano de 2020 ou a consagração da regra da interrupção dos prazos cuja contagem ficou prejudicada pelo surto pandémico – dificilmente recuperarão o atraso decorrente da pandemia que, praticamente, paralisou a justiça.
 
[1] O presente texto corresponde à intervenção proferida no âmbito da sessão de estudo, intitulada “Atos Processuais e Prazos no âmbito da pandemia da doença Covid-19”, promovida pela AEDREL – Associação de Estudos de Direito Regional e Local, realizada no dia 22 de junho de 2020, via colibri zoom.
[2] No âmbito nacional, o “estado de emergência” foi decretado através do Decreto do Presidente da República n.º 14A/2020, de 18 de março, entretanto renovado pelos Decretos do Presidente da República n.ºs 17-A/2020, de 2 de abril, e 20-A/2020, de 17 de abril. Posteriormente, a Resolução do Conselho de Ministros n.º 33-A/2020, de 30 de abril, viria a declarar a situação de calamidade em todo o território nacional, a qual viria a ser prorrogada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 38/2020, de 17 de maio, pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 40A/2020, de 29 de maio, bem como pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 43-B/2020, de 12 de junho, razão pela qual, presentemente, o território nacional encontra-se em situação de calamidade “até às 23:59h do dia 28 de junho de 2020, sem prejuízo de prorrogação ou modificação na medida em que a evolução da situação epidemiológica o justificar”.
[3] Note-se que, antes mesmo da adoção dessas medidas legislativas, o Conselho Superior da Magistratura, através da Divulgação n.º 69/2020, de 11 de março, viria a determinar que “nos Tribunais Judiciais de 1ª Instância só deverão ser realizados os actos processuais e diligências nos quais estejam em causa direitos fundamentais, sem prejuízo da possibilidade de realização do demais serviço a cargo dos Srs. Juízes (as) que possa ser assegurado remotamente”, vigorando tais medidas até ao dia 26 de março de 2020. Paralelamente, o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, através do Comunicado n.º 2/2020, de 12 de março, viria a recomendar “aos Senhores Juízes dos tribunais administrativos e fiscais que até ao dia 31 de Março de 2020 realizem apenas atos e diligências processuais de natureza presencial em processos de natureza urgente em que estejam em causa direitos, liberdades e garantias, cancelando todas as demais agendadas até essa data, altura em que se procederá a uma reavaliação da situação”.
[4] Este diploma viria a ser retificado pela Declaração de Retificação n.º 20/2020, de 15 de maio.
[5] Em todo o caso, no que concerne à produção de efeitos, este diploma legal produziu efeitos no dia da sua aprovação, ou seja, no dia 12 de março de 2020, com exceção do disposto nos arts. 14.º a 16.º, que produziu efeitos desde o dia 9 de março de 2020, e do disposto no capítulo VIII, que produziu efeitos desde o dia 3 de março de 2020.
[6] Doravante designado abreviadamente por “CPC”.
[7] Atento o fundamento para a suspensão do prazo, o art. 15.º, n.º 2, veio esclarecer que essa suspensão da contagem do prazo “cessa com a declaração da autoridade pública de reabertura das instalações”.
[8] Criticando esta solução, atento o facto de os tribunais não terem, efetivamente, encerrado, vide LEITÃO, Luís Menezes, “Os prazos em tempos de pandemia COVID-19”, in Estado de Emergência – COVID 19 – Implicações na Justiça, Centro de Estudos Judiciários, 2000, p. 61 (disponível em http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/ outros/eb_Covid19.pdf).
[9] No que concerne à entrada em vigor deste diploma legal, o seu art. 11.º preceitua que o mesmo entrou em vigor no dia seguinte ao da sua publicação. Contudo, o art. 10.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, estatui que esta produz efeitos “à data de produção de efeitos do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março”.
Atenta a manifesta infelicidade do legislador na redação deste art. 10.º, o art. 5.º da Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril, veio, sob a epígrafe de “Norma interpretativa”, esclarecer que “O artigo 10.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, deve ser interpretado no sentido de ser considerada a data de 9 de março de 2020, prevista no artigo 37.º do DecretoLei n.º 10-A/2020, de 13 de março, para o início da produção de efeitos dos seus artigos 14.º a 16.º, como a data de início de produção de efeitos das disposições do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março”.
[10] Neste particular, dispõe o art. 2.º que “O conteúdo do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, é parte integrante da presente lei, produzindo efeitos desde a data de produção de efeitos do referido decreto-lei.”. Com efeito, o objetivo do legislador terá sido o de evitar um eventual juízo de inconstitucionalidade orgânica, atento o facto de o Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 19 de março, legislar sobre direitos, liberdades e garantias, matéria essa que, nos termos do art. 165.º, n.º 1, al. b), da Constituição de República Portuguesa, só poderia ser legislada pela Assembleia da República.
[11] Observe-se, a este respeito, que o legislador português, ao invés do que sucedeu nos ordenamentos jurídicos espanhol, italiano e francês, não consignou expressamente na lei a suspensão dos prazos processuais. 
Com efeito, no ordenamento jurídico espanhol, o n.º 1 da disposição adicional segunda do Real Decreto 463/2020, de 14 de março, estabeleceu a regra, em matéria civil, segundo a qual “Se suspenden términos y se suspenden e interrumpen los plazos previstos en las leyes procesales para todos los órdenes jurisdiccionales. El cómputo de los plazos se reanudará en el momento en que pierda vigencia el presente real decreto o, en su caso, las prórrogas del mismo.”.
Do mesmo modo, no ordenamento jurídico italiano, o Decreto-legge 17 marzo 2020 estipulou, no seu art. 83.º, o adiamento, para data posterior a 15 de abril de 2020, de todas as audiências civis e penais que se encontrassem marcadas para o período de tempo compreendido entre 9 de março e 15 de abril de 2020, bem como a suspensão do decurso dos prazos para a prática de atos civis ou penais, designadamente os prazos relativos para a fase preliminar do processo, para a propositura de ações judiciais, para os procedimentos executivos, para a impugnação e, em geral, todos os prazos processuais. Na eventualidade de o início do decurso do prazo coincidir com o período da suspensão – isto é, entre os dias 9 de março e 15 de abril –, o termo inicial do prazo foi diferido para o termo desse período de suspensão. Já no que concerne aos prazos contados de modo regressivo, o referido diploma legal estabeleceu a regra segundo a qual, na eventualidade de o termo do prazo coincidir, total ou parcialmente, com o período da suspensão, a audiência ou o ato a partir do qual se contava o prazo seria diferida para um momento posterior, por forma a se permitir o respeito pelo período de suspensão fixado pelo legislador. Ficaram, no entanto, excluídos deste regime de suspensão dos prazos e dos atos processuais, designadamente, as ações relativas a menores, as ações referentes a obrigações de alimentos, os procedimentos cautelares que tivessem por finalidade a proteção de direitos fundamentais das pessoas, os procedimentos para a adoção de providências em matéria de tutela, administração de sustento, interdição ou inabilitação, que fossem incompatíveis com a adoção de medidas provisórias, os procedimentos para adoção tendo em vista a proteção contra abusos familiares, os procedimentos relativos ao acolhimento ou à expulsão de estrangeiros, os procedimentos cautelares, os processos relativos a pessoas detidas, bem como os demais processos que revestissem natureza urgente. Paralelamente, o art. 84.º do citado diploma legal determinou a suspensão de todos os prazos relativos ao processo administrativo, assim como o adiamento das audiências de julgamento que se encontrassem aprazadas para o período de suspensão. 
Entretanto, o Decreto-Legge 8 aprile 2020, n. 23, viria a determinar, no seu art. 36.º, a prorrogação da suspensão dos prazos até ao dia 11 de maio de 2020, começando, por isso, os prazos a correr a partir do dia 12 de maio de 2020.
Já no ordenamento jurídico francês, a Ordonnance n.º 2020-306 du 25 mars, viria, igualmente, a proteger todos os prazos relativos à prática de atos referentes ao período de tempo compreendido entre os dias 12 de março de 2020 e 23 de junho de 2020, enveredando, não pela suspensão dos prazos, mas antes pela interrupção dos prazos, iniciando-se a sua contagem após o dia 23 de junho de 2020. Com efeito, o legislador determinou que qualquer ato, recurso, ação legal, formalidade, registo, declaração, notificação ou publicação prescrita por lei ou regulamento sob pena de nulidade, sanção, caducidade, exclusão, limitação de validade, inadmissibilidade, extinção, desistência, aplicação de um regime especial, que devesse ter sido praticado naquele período de tempo, será considerado como tendo sido atempadamente praticado, desde que, a partir do fim desse período, seja praticado dentro do respetivo prazo, com o limite máximo de dois meses.
[12] Doravante designado abreviadamente por “CC”.
[13] Em sede direito comparado, no ordenamento jurídico espanhol, a disposição adicional quarta do Real Decreto 463/2020, de 14 de março, estabeleceu, do mesmo modo, a regra segundo a qual “Los plazos de prescripción y caducidad de cualesquiera acciones y derechos quedarán suspendidos durante el plazo de vigencia del estado de alarma y, en su caso, de las prórrogas que se adoptaren”.
[14] Vide, quanto ao sentido e ao alcance deste preceito legal, LIMA, Pires de / VARELA, Antunes, Código Civil Anotado, vol. I, 4.ª ed. rev. e atual., Coimbra Editora, Coimbra, 1987, pp. 288 e 289.
[15] Cfr., em sentido contrário, SOUSA, Miguel Teixeira de / CARVALHO, J. H. Delgado de, “As medidas excecionais e temporárias estabelecidas pela L 1-A/2020, de 19/3 (repercussões na jurisdição civil), p. 6, disponível em https://drive.google.com/file/d/18uig2uGf7BCZEMC2zcHBM8EhJCZYow0V/view, segundo os quais este regime de suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade só se aplicava em relação aos prazos de prescrição e de caducidade que, à data de 9 de março de 2020, se encontrassem nos últimos três meses.
[16] Recorde-se que, à luz do art. 28.º da Lei da Organização do Sistema Judiciário, as férias judiciais decorrem de 22 de dezembro a 3 de janeiro, do domingo de Ramos à segunda-feira de Páscoa e de 16 de julho a 31 de agosto.
[17] Este diploma legal entrou em vigor no dia 7 de abril de 2020. Todavia, no que concerne à produção de efeitos, o art. 6.º, n.º 1, estabelece que esta lei produz efeitos à data de produção de efeitos do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, ou seja, no dia 12 de março de 2020. Contudo, o art. 6.º, n.º 2, preceitua que “O artigo 7.º da Lei         n.º 1-A/2020, de 19 de março, na redação introduzida pela presente lei, produz os seus efeitos a 9 de março de 2020, com exceção das normas aplicáveis aos processos urgentes e do disposto no seu n.º 12, que só produzem efeitos na data da entrada em vigor da presente lei.”.
[18] Do mesmo modo, em sede de direito comparado, no ordenamento jurídico espanhol, o Real Decreto-ley 8/2020, de 17 de março, o art. 43.º, n.º 1, veio dispor que “Mientras esté vigente el estado de alarma, el deudor que se encuentre en estado de insolvencia no tendrá el deber de solicitar la declaración de concurso”.
[19] De facto, como bem observa Catarina Serra, “A necessidade de uma medida que suspenda a obrigação de apresentação à insolvência durante este período é evidente. Os empresários ou administradores das empresas estão, nesta altura, sob fortíssima pressão. Por um lado, sabem que, por uma causa extraordinária, a empresa deixou de ter liquidez e que em breve lhes será impossível fazer face aos compromissos correntes (se não atingiu já essa situação); por outro lado, sabem que se não cumprirem a obrigação de apresentação à insolvência nos trinta dias seguintes à data do conhecimento da insolvência ou à data em que devessem conhecê-la, ficam sujeitos aos efeitos da insolvência culposa [cfr. artigo 18.º, n.ºs 1 e 3, 19.º e 189.º, n.º 2, al. a), e 186.º, n.º 2, do CIRE].
Em quase todas as empresas o ambiente é este. Para grande parte delas, porém, a liquidação patrimonial não é a solução adequada ou justa. É preciso espaço / tempo, para avaliar a situação. É preciso espaço / tempo para identificar as empresas que seriam viáveis não fosse ter ocorrido aquela causa extraordinária e que terão, no futuro, boas perspectivas de retomar o curso normal da actividade económica.” (SERRA, Catarina, “Covid-19/Para uma legislação para a crise das empresas em tempos de “crise total”, disponível em “https://observatorio. almedina.net/index.php/2020/04/03/covid-19-para-uam-legislacao-para-a-crise-das-empresas-em-tempos-de-crisetotal”).
[20] Em sede de direito comparado, o n.º 2 da disposição adicional segunda do Real Decreto 463/2020, de 14 de março, veio preceituar que “En el orden jurisdiccional penal la suspensión e interrupción no se aplicará a los procedimientos de habeas corpus, a las actuaciones encomendadas a los servicios de guardia, a las actuaciones con detenido, a las órdenes de protección, a las actuaciones urgentes en materia de vigilancia penitenciaria y a cualquier medida cautelar en materia de violencia sobre la mujer o menores. Asimismo, en fase de instrucción, el juez o tribunal competente podrá acordar la práctica de aquellas actuaciones que, por su carácter urgente, sean inaplazables”.
[21] A este propósito, o n.º 10 do mesmo preceito legal veio esclarecer que “10 - A suspensão dos prazos em procedimentos tributários, referida na alínea c) do número anterior, abrange apenas os atos de interposição de impugnação judicial, reclamação graciosa, recurso hierárquico, ou outros procedimentos de idêntica natureza, bem como os atos processuais ou procedimentais subsequentes àqueles.”
[22] Em sede direito comparado, no ordenamento jurídico espanhol, o nº 1 da disposição adicional terceira do Real Decreto 463/2020, de 14 de março, veio, do mesmo modo, estabelecer o regime segundo o qual “Se suspenden términos y se interrumpen los plazos para la tramitación de los procedimientos de las entidades del sector público. El cómputo de los plazos se reanudará en el momento en que pierda vigencia el presente real decreto o, en su caso, las prórrogas del mismo”.
[23] Entretanto, por força da Lei n.º 14/2020, de 9 de maio, a redação do art. 8.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, viria a ser alterada, no sentido de se passar a prever que essa suspensão verifica-se até ao dia 30 de setembro de 2020.
[24] Observe-se que, quanto à cessação da sua vigência, o art. 10.º preceitua que “A presente lei cessa a sua vigência na data fixada pelo decreto-lei previsto no n.º 2 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, o qual declara o termo da situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARSCoV-2 e da doença COVID-19”.
[25] Vide, a este respeito, o ac. do TRL de 15.04.2020, proc. 358/18.5GCTVD-C.L1-3, no qual se decidiu, a propósito da aplicação das medidas de coação e de garantia patrimonial, que “O surto pandémico que ocorre no país, não faz parte da alteração de circunstância nem implica uma atenuação das exigências cautelares”.
[26] O art. 3.º, n.º 1, dispõe o seguinte: “O membro do Governo responsável pela área da justiça pode propor ao Presidente da República o indulto, total ou parcial, da pena de prisão aplicada a recluso que tenha 65 ou mais anos de idade à data da entrada em vigor da presente lei e seja portador de doença, física ou psíquica, ou de um grau de autonomia incompatível com a normal permanência em meio prisional, no contexto desta pandemia”.
[27] Vide, a este propósito, a Declaração de Retificação à Lei n.º 10/2020, de 18 de abril.
[28] À luz do art. 6.º deste diploma legal, o regime constante do art. 15.º-A produz efeitos a 13 de março de 2020.
[29] Nos termos do seu art. 10.º, a Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, entrou em vigor no quinto dia seguinte ao da sua publicação.
[30] A qual aprovou medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19.
[31] O qual estabeleceu medidas excecionais e temporárias relativas à situação epidemiológica do novo coronavírus - COVID 19.
[32] No que concerne à técnica legislativa, não se percebe a opção do legislador de revogar o art. 7.º e de aditar, em alternativa, o art. 6.º-A, quando é certo que, por estar em causa, em ambas as situações, a definição de um regime processual excecional em matéria de prazos e diligências, teria sido preferível alterar a redação do art. 7.º, assim se garantindo uma maior segurança jurídica.
[33] Recorde-se que, nos termos do art. 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, a realização das diligências encontravase, em termos gerais, suspensa, sendo que apenas se realizavam as diligências relativas aos processos urgentes       (n.º 7), aos processos e procedimentos para defesa dos direitos, liberdades e garantias lesados ou ameaçados de lesão por quaisquer providências inconstitucionais ou ilegais, referidas no artigo 6.º da Lei n.º 44/86, de 30 de setembro, na sua redação atual, ao serviço urgente previsto no art. 53.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de março, na sua redação atual, bem como aos processos, procedimentos, atos e diligências que se revelassem necessários a evitar dano irreparável, designadamente os processos relativos a menores em risco ou a processos tutelares educativos de natureza urgente e as diligências e julgamentos de arguidos presos.
[34] Sobre o que se deva entender por “não causar prejuízo aos fins da realização da justiça”, afigura-se que se trata de um conceito indeterminado, razão pela qual caberá ao julgador verificar, caso a caso, mediante despacho fundamentado, se a realização da diligência de forma não presencial é suscetível de acautelar ou não esses fins.
[35] Ainda que a lei não seja clara, afigura-se que aquilo que o legislador quis referir é que as declarações são prestadas, não no tribunal onde corre termos a ação – já que, nesse caso, aplicar-se-ia a al. a) –, mas antes no tribunal do lugar do domicílio do arguido, da testemunha ou da parte, à semelhança do que sucede, aliás, com a prestação do depoimento das testemunhas através de videoconferência.
[36] Observe-se que, no âmbito da Proposta de Lei n.º 30/XIV, este seria, de acordo com a redação prevista para o art. 6.º-A, o regime aplicável a todas as diligências, sem distinção, portanto, entre as audiências de discussão e julgamento ou de inquirição de testemunhas e as demais diligências.
[37] Vide, a este respeito, o ac. do TRG de 2911.2004, proc. 1883/04-1, in www.dgsi.pt, no qual se consignou que “Os principais métodos não verbais de comunicação e de estabelecimento de relações são o olhar, a expressão facial [...]”, sendo que “A expressão facial é muito importante para a comunicação de estados emocionais: felicidade, medo, raiva, desgosto, alegria, tristeza, interesse, desprezo, etc.”, bem como, no mesmo sentido, o ac. do TRP de 17.09.2014, proc. 409/11.4GBTMC.P1, igualmente disponível in www.dgsi.pt.
[38] Observe-se, a este respeito, que, à luz dos arts. 206.º da Constituição da República Portuguesa e 606.º, nº 1, do CPC, a publicidade da audiência só pode ser restringida, por decisão fundamentada do juiz, nos casos em que seja necessário salvaguardar a dignidade das pessoas e da moral pública ou garantir o normal funcionamento da audiência.
[39] De acordo com as autoridades de saúde, os grupos de risco são as pessoas com idade avançada (65 anos ou mais), portadoras de doenças crónicas (como, por exemplo, doença cardíaca, doença pulmonar, doença oncológica, hipertensão arterial, diabetes) ou que tenham o seu sistema imunitário debilitado (tais como, por exemplo, doentes em tratamentos de quimioterapia, em tratamentos para doenças autoimunes (artrite reumatoide, lúpus, esclerose múltipla ou algumas doenças inflamatórias do intestino), infetados com o vírus da imunodeficiência humana ou transplantados.
[40] Criticando, no entanto, o facto de a lei afastar os magistrados dessa prerrogativa ou benefício, vide MARTINS, José Joaquim Fernandes Oliveira, “(De novo a) Lei n.º 1-A/2020 – uma terceira leitura (talvez final?)”, in Julgar On-Line, maio de 2020, p. 16.
[41] Defendendo, pelo contrário, que a aplicação deste regime independe do facto de a diligência ter ou não lugar em moldes presenciais, vide MARTINS, José Joaquim Fernandes Oliveira, “(De novo a) Lei n.º 1-A/2020 – uma terceira leitura (talvez final?)”, op. cit., p. 18.
[42] Como bem observa MARTINS, José Joaquim Fernandes Oliveira, “(De novo a) Lei n.º 1-A/2020 – uma terceira leitura (talvez final?)”, op. cit., p. 5, o facto de a Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, ter deixado de aludir ao regime da suspensão dos prazos, então previsto no art. 7.º, n.º 1, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, permite concluir, a contrario, que a revogação desse artigo redundou no afastamento do regime excecional da suspensão dos prazos processuais.
[43] Doravante designado abreviadamente por “CIRE”.
[44] Recorde-se que, diferentemente, o art. 7.º, n.º 3, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, consagrava a “suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os tipos de processos e procedimentos” e que o nº 4 desse preceito estabelecia que essa solução prevalecia “sobre quaisquer regimes que estabeleçam prazos máximos imperativos de prescrição ou caducidade, sendo os mesmos alargados pelo período de tempo em que vigorar a situação excecional”, sendo certo que, nos termos do n.º 2 dessa disposição, esse regime cessaria em data a definir por decreto-lei, no qual se declararia o termo da situação excecional.
[45] Neste particular, em sede de discussão legislativa, o grupo parlamentar do Partido Social Democrata viria a propor a seguinte redação: “Enquanto se mantiver a proibição de entrada nos estabelecimentos prisionais, as diligências com arguidos presos à ordem do respetivo processo ou de qualquer outro ficam suspensas se o defensor invocar a necessidade de conferenciar presencialmente com o arguido para preparação da defesa”.
[46] Recorde-se que, na sua redação original, o art. 14.º apenas previa o justo impedimento quanto à prática presencial de atos processuais e procedimentais, bem como ao não comparecimento em diligências ou ao seu adiamento. 
[47] Esta expressão não constava da Proposta de Lei n.º 30/XIV.
[48] A formulação legal “consideram-se vencidos” não nos parece a mais feliz, já que teria sido preferível, ao invés, que o legislador tivesse dito que tais prazos “vencer-se-ão”.
[49] Em todo o caso, este regime afasta-se da solução geral que decorre do art. 312.º do Código Civil, segundo o qual “A prescrição suspende-se durante o tempo em que o titular estiver impedido de fazer valer o seu direito, por motivo de força maior, no decurso dos últimos três meses do prazo.”.
[50] Com efeito, conforme decorre do preâmbulo do Real Decreto-ley 16/2020, de 28 de abril, “Por otra parte, los plazos y términos previstos en las leyes procesales quedaron afectados como consecuencia de la declaración del estado de alarma para la gestión de la situación de crisis sanitaria ocasionada por el COVID-19 con la entrada en vigor del Real Decreto 463/2020, de 14 de marzo, salvo los supuestos excepcionados en la disposición adicional segunda del mismo real decreto. En aras de la seguridad jurídica resulta necesario establecer unas reglas generales para el cómputo de los plazos, optándose en el artículo 3 por el reinicio del cómputo de los plazos y por no tomar en consideración, por tanto, el plazo que hubiera transcurrido previamente a la declaración del estado de alarma”. Assim, o art. 2.º, n.º 1, vem estabelecer que “Los términos y plazos previstos en las leyes procesales que hubieran quedado suspendidos por aplicación de lo establecido en la disposición adicional segunda del Real Decreto 463/2020, de 14 de marzo, por el que se declara el estado de alarma para la gestión de la situación de crisis sanitaria ocasionada por el COVID-19, volverán a computarse desde su inicio, siendo por tanto el primer día del cómputo el siguiente hábil a aquel en el que deje de tener efecto la suspensión del procedimiento correspondiente”.
[51] Deste modo, nos termos do art. 2.º, n.º 2, do Real Decreto-ley 16/2020, de 28 de abril, “Los plazos para el anuncio, preparación, formalización e interposición de recursos contra sentencias y demás resoluciones que, conforme a las leyes procesales, pongan fin al procedimiento y que sean notificadas durante la suspensión de plazos establecida en el Real Decreto 463/2020, de 14 de marzo, así como las que sean notificadas dentro de los veinte días hábiles siguientes al levantamiento de la suspensión de los plazos procesales suspendidos, quedarán ampliados por un plazo igual al previsto para el anuncio, preparación, formalización o interposición del recurso en su correspondiente ley reguladora”.
[52] Neste particular, o art. 11.º do Real Decreto-ley 16/2020, de 28 de abril, estabelece o seguinte regime: “1. Hasta el 31 de diciembre de 2020 el deudor que se encuentre en estado de insolvencia no tendrá el deber de solicitar la declaración de concurso, haya o no comunicado al juzgado competente para la declaración de este la apertura de negociaciones con los acreedores para alcanzar un acuerdo de refinanciación, un acuerdo extrajudicial de pagos o adhesiones a una propuesta anticipada de convenio. 2. Hasta el 31 de diciembre de 2020, los jueces no admitirán a trámite las solicitudes de concurso necesario que se hayan presentado desde la declaración del estado de alarma. Si antes del 31 de diciembre de 2020 el deudor hubiera presentando solicitud de concurso voluntario, se admitirá ésta a trámite con preferencia, aunque fuera de fecha posterior a la solicitud de concurso necesario.  3. Si antes del 30 de septiembre de 2020 el deudor hubiera comunicado la apertura de negociaciones con los acreedores para alcanzar un acuerdo de refinanciación, un acuerdo extrajudicial de pagos o adhesiones a una propuesta anticipada de convenio, se estará al régimen general establecido por la ley”.
[53] Assim, o art. 19.º, n.º 1, do Real Decreto-ley 16/2020, de 28 de abril, dispõe o seguinte: “1. Durante la vigencia del estado de alarma y hasta tres meses después de su finalización, constituido el Juzgado o Tribunal en su sede, los actos de juicio, comparecencias, declaraciones y vistas y, en general, todos los actos procesales, se realizarán preferentemente mediante presencia telemática, siempre que los Juzgados, Tribunales y Fiscalías tengan a su disposición los medios técnicos necesarios para ello”.

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* Marco Carvalho Gonçalves
Professor Auxiliar da Escola de Direito da Universidade do Minho
Investigador do Centro de Investigação em Justiça e Governação (JusGov)