Suzana Fernandes da Costa

Publicado: 23 de março de 2021

Análise Legislativa
FISCAL


A Lei n.º 7/2021 de 26 de fevereiro e o reforço das garantias dos contribuintes


Foi recentemente publicado um diploma que altera as principais normas processuais tributárias, e que tem por objetivo proceder ao reforço das garantias dos contribuintes e a alguma simplificação processual. Falamos da Lei n.º 7/2021, de 26 de fevereiro, cujo conteúdo poderá ser relevante para a maioria dos advogados, e que nos propomos analisar nestas linhas.

Veremos, em concreto, as alterações efetuadas à Lei Geral Tributária, ao Código do Procedimento e do Processo Tributário, ao Regime Jurídico da Arbitragem em matéria Tributária, ao Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira e ao Regime Geral das Infrações Tributárias.  

 
  1. Alterações à LGT

Na Lei Geral Tributária, a Lei n.º 7/2021 procede à alteração de vários artigos (concretamente os 1.º, 11.º, 12.º, 20.º, 24.º, 25.º, 26.º, 31.º, 40.º, 42.º, 49.º, 57.º, 59.º, 63.º-A, 68.º, 68.º-A, 94.º, 100.º, 102.º e 105) e ao aditamento do novo 57.º-A/2021.

Algumas das alterações agora efetuadas são de caráter terminológico, nomeadamente:
- no art.º 1.º passa a fazer-se referência a Direito da União Europeia;
- em vários artigos substitui-se a referência à “falência” pela referência a “insolvência” (por ex.º nos artigos 25.º e 26.º) – tendência que se verificará também no CPPT.
- no art.º 11.º, a epígrafe passa a incluir a integração de lacunas (que consta do 11.º, n.º 4), a par da interpretação das normas fiscais.

Há depois outras alterações que podem parecer terminológicas, mas encerram uma alteração substantiva mais profunda: em vários artigos substitui-se a expressão “impostos” por “tributos” – o que fará com que as normas respetivas deixem de se aplicar só aos impostos e passem a aplicar-se também a taxas e contribuições especiais – veja-se nomeadamente os artigos 12.º[1], 25.º e 26.º[2] LGT.

Em dois artigos, é introduzida a expressão “designadamente” por razões de correção terminológica – para reforçar o caráter exemplificativo das situações aí referidas, já reiterados pela doutrina e pela jurisprudência. É o caso do artigo 20.º, n.º 2 sobre substituição tributária onde se diz agora que “a substituição tributária é efetivada, designadamente, através do mecanismo de retenção na fonte do imposto devido”[3].

O mesmo se passa no artigo que define e elenca as obrigações tributárias acessórias – art.º 31.º, n.º 2 LGT- que a partir da entrada em vigor da lei passa assumidamente a ser exemplificativo.

Outras alterações relevantes prendem-se com o regime da responsabilidade tributária.

No n.º 3 do artigo 24.º volta-se a exigir que para a responsabilização subsidiária dos contabilistas certificados por dívidas tributárias seja necessário à AT provar o dolo.

Na prática esta alteração torna mais difícil a reversão contra estes profissionais.

Quanto ao artigo 40.º que regula o pagamento das dívidas tributárias, é introduzido um novo número que determina como são imputados os pagamentos relativos a dívidas de recursos próprios tradicionais da União Europeia (onde se incluem os direitos aduaneiros, os direitos niveladores agrícolas e as quotizações sobre a produção de açúcar e isoglicose). Nestes casos o pagamento é sucessivamente imputado: à dívida tributária, incluindo juros compensatórios; aos juros moratórios e finalmente a outros encargos legais. A ordem de imputação é assim diferente da que existe para os pagamentos dos restantes tributos.

No artigo 42.º, por sua vez, deixa de se proibir que este tipo de dívidas possa ser pago em prestações.

Relevante é também a alteração ao artigo da prescrição das dívidas tributárias – art.º 49.º - que passa a prever duas novas causas de suspensão da prescrição:
- Quando se encontre pendente reclamação judicial ao abrigo do art.º 276.º CPPT e desta resulte a impossibilidade de praticar atos coercivos no respetivo processo de execução (por ex.º se estiver em causa o indeferimento de uma dispensa de garantia).
-  Até ao termo do prazo de suspensão e cessação de efeito a que se refere o novo n.º 3 do artigo 169.º CPPT - que analisaremos adiante.

O artigo dos prazos tributários sofre também uma precisão. No n.º 3 diz-se agora que:
“3 – No procedimento tributário, os prazos são contínuos e contam-se nos termos do artigo 279.º do Código Civil”. Na versão anterior a remissão era feita para o Código Civil no seu todo.

No espírito de melhorar a colaboração entre a AT e os sujeitos passivos, o art.º 59.º passa a dizer que  “o dever de colaboração da AT com o contribuinte compreende a disponibilização no Portal das Finanças dos formulários digitais, em formato que possibilite o seu preenchimento e submissão, para o cumprimento das obrigações declarativas previstas nos artigos 57.º e 113.º do Código do IRS e nos artigos 120.º e 121.º do Código do IRC, com uma antecedência mínima de 120 dias em relação à data limite do cumprimento da obrigação declarativa” (al. o)[4].

Outra alteração relevante prende-se com o dever de comunicação das entidades financeiras à AT dos pagamentos com cartão de débito e crédito, previsto no art.º 63.º-A. Até aqui a obrigação do n.º 4 era só para pagamentos a cidadãos com rendimentos da categoria B (como os advogados); agora passa a ser obrigatório comunicar pagamentos feitos a todas as entidades[5].

O instituto das informações vinculativas – previsto no art.º 68.º LGT – sofre também relevantes alterações.

Por um lado, prevê-se que a AT possa ouvir o contribuinte (a pedido deste ou por iniciativa daquela) antes da conclusão do procedimento (n.º 13), ficando suspensos os prazos de resposta.

Com vantagem para os contribuintes, nestas informações urgentes introduz-se a possibilidade da dispensa ou da redução especial da taxa de urgência, no caso de os sujeitos passivos requerentes preencherem os critérios de insuficiência económica definidos para a concessão da proteção jurídica ao abrigo do regime de acesso ao direito e aos tribunais. Por outro lado, cria‑se um regime de desconto na taxa: esta situar-se-á entre as 12,5 unidades de conta e as 125 unidades de conta, no caso de pessoas singulares que aufiram um rendimento máximo anual até ao limite superior do quarto escalão da tabela de IRS  e no caso de micro, pequenas e médias empresas, (de acordo com os critérios definidos no artigo 2.º do anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007, de 6 de novembro), a fixar em função da complexidade da matéria. Estas alterações ainda terão de ser regulamentadas por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça e só entram em vigor em 01 de julho de 2021 (artigo 17.º da Lei n.º 7/2021).

Outra alteração relevante prende-se com as chamadas orientações genéricas, previstas no artigo 68.º-A, que agora deverão ser revistas quando:
“a) Versem sobre matéria apreciada em decisão sumária por um tribunal superior, nos termos do artigo 656.º do Código de Processo Civil; ou
b) Exista acórdão de uniformização de jurisprudência proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo; ou
c) Exista jurisprudência reiterada dos tribunais superiores, manifestada em cinco decisões transitadas em julgado no mesmo sentido, sem que existam decisões dos tribunais superiores em sentido contrário igualmente transitadas em julgado, em número superior”.

A versão anterior era muito mais genérica. Falta, a nosso ver, na lei um mecanismo concreto que permita obrigar a AT a proceder a esta revisão.

O art.º 100.º, por sua vez, já previa o dever de plena reconstituição da situação tributária em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo. Agora a lei passa a fixar um prazo concreto para a reconstituição da situação no procedimento tributário, incluindo pagamento de juros indemnizatórios, devendo a reposição da legalidade ser executada no prazo de 60 dias.

No artigo 105.º precisou-se que a alçada dos tribunais tributários corresponde àquela que se encontra estabelecida no Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (concretamente no artigo 6.º ETAF) – o que já resultava da Lei n.º 114/2019, de 12/09.

Finalmente, foi aditado o artigo 57.º-A, que cria as chamadas férias fiscais, com a epígrafe “Diferimento e suspensão extraordinários de prazo”. Como é sabido, o regime das férias judiciais não suspendia os prazos no procedimento tributário, problema que é atenuado com este novo artigo. Segundo o n.º 1, “sem prejuízo das regras gerais e especiais de caducidade e prescrição, as obrigações tributárias cujo prazo termine no decurso do mês de agosto podem ser cumpridas até ao último dia desse mês, independentemente de ser útil, sem quaisquer acréscimos ou penalidades”.

Este número abrange obrigações de pagamento e obrigações declarativas, mas salvaguarda “as regras gerais e especiais de caducidade e prescrição.

Por sua vez, os prazos nos procedimentos impugnatórios administrativos (incluindo direito de audição)  que terminem no decurso do mês de agosto são transferidos para o primeiro dia útil do mês seguinte (n.º 2) e também os senhores inspetores tributários terão direito às férias fiscais, já que  são suspensos os prazos relativos ao procedimento de inspeção tributária durante o mês de agosto, para efeitos do artigo 36.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira” (n.º 3 do art.º 57.º-A LGT).

 
  1. Alterações ao RCPITA

No Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira as principais alterações prendem-se com a possibilidade de efetuar notificações dos relatórios por via eletrónica (62.º e 63.º-A)[6] e com a criação da reunião de regularização (art.º 58.º-A).

Aquando da notificação do projeto de relatório de inspeção, o contribuinte pode pedir a regularização da sua situação tributária (total ou parcial). É agendada uma reunião no prazo de 15 dias entre ele ou mandatário com poderes especiais e o inspetor tributário e o dirigente do serviço competente para o procedimento de inspeção, com o objetivo de definir os exatos termos em que a regularização pretendida se deve concretizar, designadamente, quais as obrigações declarativas a cumprir para o efeito pela entidade inspecionada, com detalhe do respetivo teor. A nosso ver os advogados poderão naturalmente acompanhar os contribuintes a estas reuniões.

Uma consequência perniciosa das reuniões de regularização consta do n.º 6 do art.º 58.º-A, cuja inconstitucionalidade achamos que mais cedo ou mais tarde será levantada por eventual violação do direito a uma tutela judicial efetiva. Diz a lei que “a assinatura pela entidade inspecionada ou por quem a legalmente represente do documento de regularização preclude o direito desta de sindicar a legalidade das correções projetadas objeto do documento assinado, caso a entidade inspecionada proceda à regularização no prazo previsto no n.º 4”.

Se o contribuinte optar pela regularização disso será dado conta no relatório definitivo e poderá beneficiar de redução das coimas para 50% do montante mínimo respetivo (possibilidade que veremos adiante).

Além das normas supra citadas, são alteradas algumas regras de competência (art.s 16.º e 17.º), e foi necessário acomodar as mudanças que decorrem do pedido de regularização (art.º 28.º, 36.º  e art.º 58.º por ex.º).

 
  1. Alterações ao CPPT

No âmbito do procedimento e processo tributário, a Lei n.º 7/2021, de 26 de fevereiro, introduziu importantes alterações que se traduzem num reforço das garantias dos contribuintes.

Em matéria de prazos no âmbito do procedimento tributário, o artigo 20.º, n.º 1 do CPPT passa a prever expressamente que estes se contam de modo contínuo (em linha com o já referido art.º 57.º LGT).

No que diz respeito à compensação de dívidas de tributos por iniciativa da AT, já se encontrava previsto no n.º 2 do artigo 89.º do CPPT que, nas circunstâncias em que o crédito fosse insuficiente para o pagamento da totalidade das dívidas e acrescido, este seria aplicado sucessivamente no pagamento dos juros, de outros encargos legais e do capital em dívida. Porém, agora ressalva-se, por remissão para a parte final do n.º 2 do artigo 262.º do CPPT, que o crédito será aplicado na dívida mais antiga, incluindo os juros compensatórios.

No que concretamente respeita ao processo de execução fiscal, determina-se a obrigatoriedade de se identificar no título executivo o número de contribuinte do/dos devedores e desaparece a menção à identificação do domicílio dos devedores.

Uma novidade de extrema relevância, prende-se com a suspensão do processo de execução fiscal no período que decorre entre o termo do prazo de pagamento voluntário e a apresentação do meio de reação contencioso ou administrativo de sindicância da legalidade da dívida, quando estão em causa dívidas tributárias de valor inferior a €5.000,00 ou a €10.000,00€, consoante estejamos pessoas singulares ou pessoas coletivas.

Quanto às dívidas tributárias que não excedam os valores acima referidos, a execução ficará suspensa por um período máximo de 120 dias, contados a partir do termo do prazo de pagamento voluntário, independentemente da prestação de garantia ou de apresentação de requerimento, até à apresentação do meio gracioso ou judicial correspondente.

Esta suspensão cessará se, no prazo de 15 dias após a apresentação do meio gracioso ou judicial, não for apresentada a competente garantia ou obtida a sua dispensa.

Para as dívidas tributárias de valor superior aos acima referidos, mantém-se a possibilidade de se requerer a prestação de garantia antecipada, nos termos do n.º 2 do artigo 169.º do CPPT, manifestando-se a intenção de apresentar o meio gracioso ou judicial para discussão da legalidade ou da exigibilidade da dívida exequenda, prevendo-se, no entanto, a obrigatoriedade de comunicar ao órgão competente para a execução a interposição do meio gracioso ou judicial, sob pena de ser extinto o procedimento.

No que respeita à caducidade de garantias, esta possibilidade já se encontrava prevista no n.º 1 do artigo 183.º-A do CPPT para as situações em que a reclamação graciosa não estivesse decidida no prazo de um ano a contar da data da sua interposição, cabendo ao interessado, nessa circunstância, invocar a caducidade da garantia mediante requerimento.  

Com as alterações introduzidas pela Lei n.º 7/2021, de 26 de fevereiro, a garantia prestada para suspender a execução em caso de reclamação graciosa passa a caducar automaticamente, se a reclamação não estiver decidida no prazo de um ano a contar da data da sua interposição. A lei continua a exigir que se faça requerimento nesse sentido.  Por outro lado, estende-se o regime da caducidade da garantia aos processos de impugnação judicial ou de oposição, quando não tiver sido proferida decisão de 1ª instância no prazo de quatro anos a contar da data da sua apresentação, dependendo tal reconhecimento de requerimento do interessado, submetido à apreciação do tribunal onde estiver pendente a impugnação, recurso, ou oposição. Perante o requerimento do interessado, o tribunal poderá decidir, através de decisão fundamentada, depois de ouvida a AT, pela caducidade da garantia, ou pela sua manutenção por um período máximo até dois anos, caso dos elementos do processo seja possível concluir pela existência de risco de prejuízo sério para o Estado.

No que respeita às citações e notificações passa a prever-se expressamente no n.º 1 do artigo 192.º do CPPT que as citações pessoais são efetivadas nos termos do Código do Processo Civil, em tudo o que não estiver especialmente regulado no CPPT e, no que concerne às notificações e citações aos administradores judiciais, foi introduzido o artigo 40.º-A que determina que elas sejam remetidas para o seu domicílio profissional.

Prevê-se, ainda, no artigo 38.º do CPPT a possibilidade de as notificações a entidades bancárias, relativas a pedidos de informação financeira ou outros atos ou diligências no âmbito do processo de execução fiscal, serem feitas através da plataforma informática de registos e transmissão de ofícios protocolada entre o Banco de Portugal e as entidades públicas ou outras entidades requerentes.

No que concerne à penhora de saldos bancários, foram introduzidas alterações ao artigo 223.º do CPPT, no sentido de simplificar o procedimento e evitar penhoras excessivas.

Assim, nos termos deste artigo, prevê-se que a penhora de saldos bancários seja efetuada mediante notificação por transmissão eletrónica de dados, para o domicílio fiscal eletrónico da depositária ou na respetiva área reservada do Portal das Finanças, com expressa menção do processo, contendo a identificação do limite máximo a penhorar, bem como a indicação de que as quantias depositadas, até àquele montante, ficam indisponíveis desde a data da penhora.

Além disso, prevê-se a obrigatoriedade de a instituição detentora do depósito penhorado comunicar, no prazo de cinco dias contados da penhora, o saldo penhorado e as contas objeto de penhora à data em que esta se considere efetuada, ou a inexistência ou impenhorabilidade da conta ou saldo e proceder ao depósito das quantias e valores penhorados à ordem do processo de execução fiscal. O incumprimento deste prazo, tem como consequência que a entidade seja executada, no próprio processo, para o pagamento do valor do depósito e das custas e despesas acrescidas.

Quanto à venda em processo executivo, estabeleceu-se no n.º 7 do artigo 244.º CPPT a possibilidade de esta ser suspensa, sempre que for do interesse da execução, nomeadamente, quando o valor dos créditos reclamados pelos credores com garantia real for manifestamente superior ao da dívida exequenda e acrescido, podendo a execução prosseguir em outros bens. E, no n.º 4 do artigo 264.º do CPPT diminui-se de 20% para 10% do valor da dívida, o montante a pagar para suspender a venda no processo de execução fiscal, e alargou-se de 15 para 30 dias o período durante o qual a venda fica suspensa por força daquele pagamento. 

Introduziu-se, ainda, uma alteração ao art.º 250.º, n.º 1, alínea b) do CPPT nos termos da qual o valor base para venda dos imóveis rústicos passa a ser o valor patrimonial atualizado com base em fatores de correção monetária ou o valor de mercado, quando superior.

E, no que respeita a aquisições no âmbito do processo executivo, cujo valor seja superior a 500 UC (51.000,00€), diminuiu-se a parte do preço a depositar no prazo de 15 dias – que passou de 1/3 para 1/5 – e aumentou-se o prazo máximo para entrega do valor restante – que passou de 8 para 12 meses. Assim, nos termos da alínea f) do n.º 1 do artigo 253.º, nestas circunstâncias, poderá ser autorizado, mediante requerimento a dirigir pelo adquirente no prazo de 5 dias a contar da decisão de adjudicação, o depósito no prazo de 15 dias de apenas parte do preço, não inferior a 1/5, obrigando-se à entrega do restante no prazo de 12 meses.

Com as alterações introduzidas pela Lei 7/2021, diminui-se o valor mínimo dos pagamentos parciais a efetuar no âmbito do processo de execução, assim como o valor mínimo de cada prestação no âmbito de planos prestacionais, passando, em ambos os casos, de uma unidade de conta para um quarto da unidade de conta.  

Com a alteração da Lei 7/2021, a reclamação judicial dos atos praticados pelo órgão de execução fiscal passa a ter efeito suspensivo da execução, quando tiver por objeto matéria que afete a totalidade da tramitação da execução. Porém, quando a reclamação incida apenas sobre parte do processo de execução fiscal, o processo suspende-se apenas quanto a essa parte.

Uma nota final no que respeita às alterações introduzidas pela Lei n.º 7/2021 ao CPPT, para referir que o legislador estabeleceu três momentos distintos para sua entrada em vigor. Assim, parte destas alterações, já se encontram em vigor, tendo iniciado a sua vigência no dia imediatamente seguinte à publicação da lei. Porém, outras apenas entrarão em vigor a 1 de julho de 2021 ou a 1 de janeiro de 2022, consoante os casos, como veremos adiante, pelo que se exigem cautelas na sua aplicação.

 
  1. Alterações ao RJAT

Em matéria de arbitragem tributária, destacamos a alteração ao artigo 6.º do RJAT que determina que a designação de árbitros pelo Conselho Deontológico tenha de ser realizada de entre os árbitros inscritos na lista por categoria de tributo, por sorteio público, não podendo desempenhar a função de árbitro aqueles que sejam mandatários ou integrem escritório de advogados em que um dos seus membros seja mandatário em qualquer processo arbitral pendente. Esta limitação estende-se, também, à designação dos árbitros pelas partes, quando o tribunal funcione com a intervenção de coletivo. 

No que respeita aos requisitos para desempenhar a função de árbitro-presidente, quando o tribunal arbitral funcione com intervenção do coletivo, exige-se que se trate de jurista que tenha exercido funções públicas de magistratura ou que possua doutoramento na área das ciências jurídico-económicas, desde que, nos últimos dois anos, não tenha prestado serviços profissionais, a qualquer parte no âmbito do processo arbitral tributário. Acresce que, os árbitros que integrem a lista de árbitros-presidente não podem ser designados pelas partes.

Quanto às notificações no âmbito da arbitragem em matéria tributária, o n.º 4 do artigo 10.º do RJAT passa a prever, expressamente, que estas se fazem por via eletrónica através do sistema de gestão processual do Centro de Arbitragem Administrativa, devendo este certificar a data da elaboração da notificação, que se presume realizada no 3.º dia posterior ao da elaboração, ou no 1.º dia útil seguinte quando este não o seja.

 
  1. Alterações ao RGIT

A Lei n.º 7/2021 introduz modificações muito significativas no Regime Geral das Infrações Tributárias. Em concreto são alterados os artigos 29.º, 30.º, 31.º, 32.º, 40.º, 41.º, 58.º, 70.º, 75.º, 79.º, 80.º, 83.º, 84.º, 92.º, 96.º, 97.º, 108.º e 128.º e aditados os artigos 28.º- A, 32.º-A e 112.º-A.

Uma primeira alteração que se saúda é a regra da notificação para regularização e para exercício do direito à redução, que consta do art.º 28.º-A. Segundo esta norma “adquirido o conhecimento da prática de infração, o infrator é notificado para, no prazo de 30 dias, proceder à regularização da situação tributária”.

O artigo 29.º que anteriormente regulava a redução de coimas passa a prever a chamada dispensa das coimas (que anteriormente estava no n.º 4 do mesmo artigo e no 32.º, 1 RGIT)

Determina-se agora que “não pode ser aplicada coima quando o agente, nos cinco anos anteriores, não tenha:

a) Sido condenado por decisão transitada em julgado, em processo de contraordenação ou de crime por infrações tributárias;

b) Beneficiado de dispensa ou de pagamento de coima com redução nos termos do presente artigo ou do artigo 30.º”

O regime anterior só permitia esta possibilidade para pessoas singulares.

Além disso mesmo quando haja reincidência o n.º 2 permite a dispensa de coima, a requerer em 30 dias, desde que se verifiquem cumulativamente as seguintes circunstâncias:
“a) A prática da infração não ocasione prejuízo efetivo à receita tributária;

b) Estar regularizada a falta cometida”.

Esta norma não se aplica a contraordenações em que esteja em falta o pagamento da prestação tributária (como a do art.º 114.º) por força do n.º 3 do art.º 29.º, mas aplica-se a muitas outras. 

Quanto à redução das coimas, esta sofre também uma assinalável melhoria, tal como resulta do art.º 30.º:  
“As coimas pagas a pedido do agente são reduzidas se o pedido de pagamento for apresentado:

a) Sem que tenha sido levantado auto de notícia, recebida participação ou denúncia ou iniciado procedimento de inspeção tributária, para 12,5 % do montante mínimo legal;

b) Até ao termo do prazo para apresentação de audição prévia no âmbito de procedimento de inspeção tributária, para 50 % do montante mínimo legal”.

Na lei anterior (art.º 29.º, n.º 1) a redução oscilava entre 12,5%, 30% (em função do tempo) e 75% (na inspeção).

O direito à redução das coimas depende:
“a) No caso previsto na alínea a), do pagamento nos 30 dias posteriores à notificação da coima reduzida pela entidade competente e da regularização da situação tributária do infrator no mesmo prazo;

b) No caso previsto na alínea b), da regularização da situação tributária do infrator dentro do prazo previsto no n.º 4 do artigo 58.º-A do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira;” (29.º, 3)”.

Por sua vez o artigo 32.º prevê a atenuação especial das coimas a pedido do infrator, caso este reconheça a sua responsabilidade e regularize a situação tributária nos 30 dias da defesa administrativa.

Quando houver lugar à atenuação especial da coima, os limites máximo e mínimo da coima são reduzidos para metade, não podendo resultar um valor inferior ao que resultaria da aplicação do artigo 30.º, nem ser inferior a 25 (euro).

O legislador prevê ainda que “quando a reduzida gravidade da infração e da culpa do agente o justifique, pode a entidade competente limitar-se a proferir uma admoestação” – art.º 32.º, 3.

Também melhora o art.º 75.º - pagamento antecipado de coima – que se limitava às contraordenações simples e agora se aplica a todas.

O RGIT teve ainda que ser adaptado às novas reuniões de regularização nas inspeções tributárias, nomeadamente no já referido art.º 29.º e ainda nos artigos 28.º-A, 32.º-A e 58.º.

Os prazos de defesa administrativa e judicial e de apresentação de garantia passam todos para 30 dias, sendo alterados os artigos 70.º, 80.º, 83.º e 84.º - mas cuidado que os novos prazos só entram em vigor a 1 de janeiro de 2022.

Nos crimes aduaneiros, o contrabando e a introdução fraudulenta no consumo são agora punidos com pena de prisão de 1 a 4 anos, ou, respetivamente, com pena de multa de 120 a 480 dias de multa, se o valor da prestação tributária em falta for superior a 15 000 (euro) ou, não havendo lugar a prestação tributária, se os produtos objeto da infração forem de valor líquido de imposto superior a 50 000 (euro), ou ainda, quando inferiores a estes valores e com a intenção de os iludir, as condutas que lhe estão associadas sejam praticadas de forma organizada ou assumam dimensão internacional. Há também um alargamento das situações de qualificação quando a mercadoria objeto da infração pertencer à Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies da Fauna e da Flora Selvagens Ameaçadas de Extinção e o seu comércio internacional estiver temporária ou definitivamente proibido (al.ª g).

Nas contraordenações em especial são alterados os artigos 108.º, 112.º-A, 128.º.

No primeiro cria-se um regime verdadeiramente excecional para uma contraordenação em particular: ocorrendo a violação do dever de declaração de dinheiro líquido não é possível a aplicação da redução de coima prevista no artigo 30.º, devendo ser sempre instaurado processo de contraordenação que garanta, em qualquer caso, a suscetibilidade de apreensão do dinheiro, prevista no n.º 5 do artigo 73.º (n.º 9).

Por sua vez o artigo 112.º-A cria uma nova contraordenação aduaneira respeitante ao incumprimento das obrigações referentes ao dever de diligência na cadeia de aprovisionamento de minerais de conflito (punível com coima de 150 até 15 000 euros).

No artigo 128.º passa a ser contraordenação a transação ou a utilização de programas ou equipamentos informáticos de faturação ou de contabilidade que não observem os requisitos legalmente exigidos – a lei anterior referia apenas os de faturação.

 
  1. Entrada em vigor

As regras de entrada em vigor constam do artigo 17.º da Lei n.º 7/2021, que estipulam 3 momentos: o dia a seguir à publicação da lei (27/02/2021), o dia 1 de julho (para questões como as reduções nas informações vinculativas urgentes) e o dia 01 de janeiro de 2022 (que abrange, por ex.º, grande parte das alterações ao RGIT).

Assim, só entram em vigor em 1 de julho os artigos 40.º, 42.º e 68.º da LGT, o artigo 89.º, o n.º 2 do artigo 196.º, 244.º, os artigos 248.º, 262.º, o n.º 4 do artigo 264.º e o artigo 271.º do CPPT, na redação dada pela presente lei, e a revogação do n.º 11 do artigo 169.º do CPPT.

Por sua vez entram em vigor apenas em 1 de Janeiro do próximo ano o artigo 40.º-A, os n.ºs 3 a 10 e 12 a 14 do artigo 169.º e o artigo 223.º do CPPT,  os artigos 28.º-A, 29.º, 30.º, 31.º, 32.º, 32.º-A, 70.º, 75.º, 79.º, 80.º, 83.º e 84.º do RGIT,  e os  artigos 28.º, 36.º, 58.º e 58.º-A e a alínea n) do n.º 3 e o n.º 4 do artigo 62.º do RCPITA.

As alterações ao RJAT já se encontram em vigor.

Teria sido mais fácil uma entrada unificada das alterações, sugerindo-se especial cuidado na análise da redação em vigor até Janeiro de 2022.


CONCLUSÕES
  • A Lei n.º 7/2021 de 26/02 traz algumas inovações importantes nas garantias dos contribuintes e na simplificação processual cujo conhecimento é útil para os advogados.
  • São introduzidas as férias fiscais, há menos custos nos pedidos de informação vinculativa urgentes, há uma maior participação dos contribuintes nas inspeções tributárias, os processos executivos suspendem-se de forma mais clara, passa a caducar a garantia nos processos judiciais tributários, melhora a dispensa de coima e a redução das coimas, e aumentam os prazos de defesa do RGIT.
  • No entanto, há alguns temas menos benéficos para os contribuintes como o agravamento de algumas infrações, o alargamento de responsabilidades dos liquidatários, o efeito preclusivo da assinatura dos relatórios de regularização e a entrada em vigor desfasada da lei.

 
[1] Que diz agora que as normas tributárias se aplicam aos factos posteriores à sua entrada em vigor, não podendo ser criados quaisquer tributos retroativos.
[2] Neste último a alteração da lei alarga a responsabilidade solidária dos liquidatários a todos os tributos.
[3] Nosso sublinhado. Exemplo de uma destas situações de substituição sem retenção é a do imposto do selo, nos casos em que tem que ser entregue por entidades diferentes do contribuinte.
[4] Nosso sublinhado.
[5] Determina a lei agora que “as instituições de crédito, sociedades financeiras e as demais entidades que prestem serviços de pagamento têm a obrigação de comunicar à Autoridade Tributária e Aduaneira, até ao final do mês de julho de cada ano, através de declaração de modelo oficial, aprovada por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças e ouvido o Banco de Portugal, o valor dos fluxos de pagamentos com cartões de crédito e de débito ou por outros meios de pagamento eletrónico, efetuados por seu intermédio, sem por qualquer forma identificar os mandantes das ordens de pagamento”.
[6] O relatório pode agora ser enviado por carta registada, ou por transmissão eletrónica de dados, através do serviço público de notificações associado à morada digital única, da caixa postal eletrónica ou na respetiva área reservada do Portal das Finanças.


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Suzana Fernandes da Costa
Advogada Especialista em Direito Fiscal. Doutora em Direito Financeiro e Tributário

Ana Martins Araújo
Advogada